quarta-feira, 31 de agosto de 2011

Modernismo - Geração de 45: João Cabral

     Morte e Vida Severina
     João cabral de Melo

"Somos muitos Severinos
iguais em tudo na vida:
na mesma cabeça grande
que a custo é que se equilibra,
no mesmo ventre crescido
sobre as msmas pernas finas,
e iguais também porque o sangue
que usamos tem pouca tinta.

E se somos Severinos
iguais em tudo na vida,
morremos de morte igual,
mesma morte severina:
que é a morte de que se morre
de velhice antes dos trinta,
de emboscada antes dos vinte,
de fome um pouco por dia
(de fraqueza e de doença
é que a morte severina
ataca em qualquer idade,
e até gente não nascida)."

     O texto acima integra a obra mais conhecida do poeta João Cabral de Melo Neto (1920-1999), o grande nome da poesia modernista da Geração de 45.
     Morte e Vida Severina é um auto, no caso, um auto de Natal, peça de origem medieval e popular. Revela, em sua estrutura, duas características centrais da obra do autor: o rigor formal e o engajamento social. O rigor se estabelece com a métrica, a rima e o ritmo marcados do poema. Cabral será conhecido, também, pelo signo da pedra, da objetividade, de busca da palavra justa, do texto conciso, avesso a sentimentalismo (na imagem, a adaptação para o cinema, de 1977, com direção de Zelito Viana e atuação de José Dumont, Stênio Garcia, Tânia Alves e Elba Ramalho).
     O sentimento de injustiça do mundo, como em Carlos Drummond de Andrade, manifesta-se no poeta pernanbucano na denúncia da vida sofrida do sertanejo pobre. O poeta acompanha a saga de Severino, personagem-símbolo e síntese de toda uma população marginalizada e famélica, no caminho até a cidade.
     Severino encontrará cenas de miséria pelo caminho, mas terminará sua trajetória diante de um nascimento. Como uma ponta de esperança na justiça da vida, soberana.

     Ode ao mestre
     João Cabral de Mello Neto desmitificou a poesia como fruto do "sentimento"
     POR Suzana Paquete

     João Cabral foi o último grande poeta brasileiro deste século. O único que lhe fez sombra foi Carlos Drummond de Andrade. No panorama internacional, sua grandeza é também inegável. Só não foi reconhecido por causa da marginalidade em que vive a língua portuguesa. João Cabral costumava dizer que não tinha biografia, ou que esta se limitava às mudanças de endereço no cargo de diplomata que exerceu em boa parte da vida. Mas é claro que há muito mais em sua história. Há as curiosidades, como um passado de futebolista ou uma enxaqueca que durou cinquenta anos. Ou a vida amorosa, que passou por dois casamentos. Ou as amizades com nomes importantes da arte brasileira e estrangeira, caso do pintor espanhol Joan Miró.
     Talvez se possa dividir seu legado em três partes. Primeiro, ele desmitificou a poesia como fruto da inspiração e do "sentimento". Ele fez versos secos,severamente controlados em seus efeitos. O segundo legado de Cabral está na poesia de cunho social, que reflete sobre o Brasil. A dureza em sua poesia não era apenas questão de gosto. Parecia-lhe a única maneira de retratar o cenário inóspito do Nordeste brasileiro, um de seus temas fundamentais. Há também algo de denúncia nesses textos.
     O terceiro aspecto importante do legado de João Cabral é sua preocupação em fazer uma poesia "participativa", que busca a comunicação com o público. João Cabral (ao lado talvez de Vinícius de Moraes) foi um dos poucos poetas brasileiros a se preocupar com isso. Daí ter aproximado o verso da narrativa. Ou ter recuperado formas populares, em Auto do Frade e, é claro, em Morte e Vida Severina, seu texto mais conhecido, musicado no palco por Chico Buarque de Holanda e utilizado até pela TV.

Atividade:

01.É correto afirmar que no poema Morte e Vida Severina, de João Cabral de Melo Neto,
a) Severino é um exemplo típico de herói moderno.
b) a cena inicial e a final apontam: na volta à terra de origem, o retirante terá a fé que aprendeu com o mestre carpina.
c) o destino que as ciganas preveem para o recém-nascido é o mesmo que Severino já cumprira ao longo de sua vida.
d) o poeta buscou exprimir a vida nordestina no estilo dos autos medievais, valendo-se da retórica que os caracterizavam.
e) o "auto de natal" se define não num sentido religioso, mas como reconhecimento da força renovadora da natureza.

02."Pelo sertão não se tem como não se viver sempre enlutado
Lá o luto não é no vestir
é de nascer com o luto nato"
(João Cabral de Melo Neto)

"Vou me embora pra Pasárgada
Lá sou amigo do Rei
Lá tenho a mulher que quero
na cama que escolherei
Vou-me embora pra Pasárgada"
(Manuel Bandeira)

Quais das afirmações combinam com as passagens acima?
1.O primeiro poema caracteriza-se pelo racionalismo e pelo rigor formal, o que não impede a denúncia social.
2.No segundo poema, a evasão do real se dá em linguagem coloquial, aproximada da prosa.
3.Os autores são pernanbucanos. O primeiro é de Geração de 45, e o segundo, da Primeira fase do Modernismo.
Está(ao) correta(s):
a) 1, 2 e 3.
b) 1 apenas.
c) 2 apenas.
d) 3 apenas.
e) 1 e 2 apenas.

                                                                            FIM

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