sábado, 30 de julho de 2011

Arcadismo - Poemas satíricos e épicos

     A novas ideias que circulavam na Europa marcaram intelectuais do país

     O período do Iluminismo foi marcado, na política, pelo conceito do despotismo esclarecido, que previa a conciliação do poder absoluto com o desejo de progresso. Tais ideias circularam no Brasil colônia em um novo contexto político, social e econômico. O eixo das atividades migrou do Nordeste, onde se cultivava a cana-de-açúcar, para o Sudeste, com a mineração. Em Minas Gerais, o enriquecimento com a exploração de ouro e pedras preciosas levou ao surgimento de vilas e cidades e à consolidação de uma classe dominante influenciada pelo pensamento iluminista. Ao mesmo tempo, os altos impostos cobrados pelo governo português para a exportação das riquezas causava irritação. Foi nesse contexto que eclodiu a Inconfidência Mineira, movimento que terminou com o enforcamento de seu líder, Tiradentes, e que envolveu alguns dos principais poetas árcades brasileiros.
     A reação ao autoritarismo, que marcou grande parte da literatura no Século das Luzes, encontra uma de suas vozes mais representativas nas Cartas Chinelas, de Tomás Antônio Gonzaga, mesmo autor do poema lírico Marília de Dirceu. Nesse poema lírico, o autor, usando o pseudônimo de Critilo, finge estar em Santiago do Chile, de onde escreve ao amigo Doroteu - na realidade, seu colega árcade Cláudio Manuel da Costa. Nos versos, Critilo ataca duramente os abusos de um "general" chamado Fanfarrão Minésio, em alusão evidente ao truculento governdor de Minas Gerais na época, Luís da Cunha Meneses.

     Do árcade ao romântico
     Temas cultivados pelo primeiro gênero seriam preservados no seguinte

     Embora inspirada em formas e temas vindos de Portugal, a produção árcade brasileira adquiriu características próprias. Em poemas épicos, os autores incorporaram elementos da realidade social, como a paisagem da mineração. Também foi explorada a natureza brasileira, com os cenários tropicais e os índios, associados ao conceito do "bom selvagem", o nativo que, na visão do filósofo francês Jean-Jacques Rousseou, vem ao mundo em um estado de pureza e inocência, sendo depois corrompido pelo ambiente. Ao lado de temas como o sentimentalismo, o sofrimento e a morte, o elemento indígena e a exploração dos cenários locais são características que prenunciam o Romantismo literário.
     Leia a seguir trechos de três poemas épicos do período árcade que apresentam essas características:

     - Cláudio Manuel da Costa escreveu o poema Vila Rica, narrando a fundação da cidade que mais tarde seria chamada de Ouro Preto:

     Poemas
     Cláudio Manuel da Costa

     (...) Vê-se outro mineiro, que se ocupa
Em penetrar por mina o duro monte
Ao rumo oblíquo, ou reto; tem defronte
Da gruta que abre, a terra que extraíra;
Os lagrimais das águas, que retira
Ao tanque artificioso logo solta;
Trazida a terra entre a corrente envolta
Baixa as grades de ferro; ali parados
Os grossos esmeris são depurados,
Deixando ao dono em prêmio da fadiga
Os bons tesouros da fortuna amiga. (...)


- Santa Rita Durão escreveu Caramuru, poema épico nos moldes de Os Lusíadas sobre o descobrimento da Bahia. Na narrativa, o português Diogo Álvares Correia, vítima de um naufrágio perto da costa, fica conhecido como Caramuru (Filho do Trovão) por possuir uma arma de fogo. Ele se casa com a índia Paraquaçu e a leva para a França. A índia Moema, apaixonada por Diogo, morre ao tentar acompanhar seu navio na partida.

     Caramuru
     Santa Rita Durão

     (...) Choraram da Bahia as Ninfas belas,
Que nadando a Moema acompanhavem;
E vendo que sem dor navegam delas,
À branca praia furor tornavam:
Nem pode o claro Herói sem pena vê-las,
Com tantas provas, que de amor lhe davam;
Nem mais lhe lembra o nome de Moema,
Sem que ou amante a chore, ou grato gema.
(...)


- Basílio da Gama foi autor de O Uruguai, sobre as disputas envolvendo espanhóis, indígenas e portugueses em torno de Sete Povos das Missões, no Uruguai. O herói dessa epopeia é Gomes Freire
de Andrade, comandante das tropas portuguesas.

     O Uruguai
     Basílo da Gama

     (...) Estão patentes as douradas portas
Do grande templo, e na vizinha praça
Se vão dispondo de uma e de outra banda
As vistosas esquadras diferentes.
Co'a chata frente de urucu tingida,
Vinha o índio Cobé disforme e feio,
Que sustenta nas mãos pesada maça,
Com que abate no campo os inimigos
Como abate a seara o rijo vento. (...)

Cartas Chilenas ( um trecho)
Tomás Antônio Gonzaga


(...)
Já disse, Doroteu, que o nosso chefe,
Apenas principia a governar-nos,
Nos pretende mostrar que tem um peito
Muito mais terno e brando, do que pedem
Os severos ofícios do seu cargo.
Agora, cuidarás, prezado amigo,
Que as chaves das cadeias já não abrem,
Comidas da ferrugem? Que as algemas,
Como trastes inúteis, se furtaram?
Que o torpe executor das graves penas
Liberdade ganhou? Que já não temos
Descalços guardiães, que à fonte levem,
Metidos nas correntes, os forçados?
Assim, prezado amigo, assim devia
Em Chile acontecer, se o nosso chefe
Tivesse, em governar, algum sistema.
Mas, meu bom Doroteu, os homens néscios
As folhas dos olmeiros se comparam:
São como o leve fumo, que se move
Para partes diversas, mal os ventos
Começam a apontar, de partes várias.
Ora, pois, doce amigo, atende o como
No seu contrário vício, degenera
A falsa compaixão do nosso chefe,
Qual o sereno mar, que, num instante,
As ondas sobre as ondas encapela.
Pretende, Doroteu, o nosso chefe
Erguer uma cadeia majestosa,
Que possa escurecer a velha fama
Da torre de Babel e mais dos grandes,
Custosos edifícios que fizeram,
Para sepulcros seus, os reis do Egito.
Talvez, prezado amigo, que imagine
Que neste monumento se conserve
Eterna, a sua glória, bem que os povos
Ingratos não consagrem ricos bustos
Nem montadas estátuas ao seu nome.
Desiste, louco chefe, dessa empresa:
Um soberbo edifício levantado
Sobre ossos de inocentes, construído
Com lágrimas dos pobres, nunca serve
De glória ao seu autor, mas, sim, de opróbrio.
Desenha o nosso chefe, sobre a banca,
Desta forte cadeia o grande risco,
A proporção do gênio e não das forças
Da terra decadente, aonde habita.
Ora, pois, doce amigo, vou pintar-te
Ao menos o formoso frontispício.
Verás se pede máquina tamanha
Humilde povoado, aonde os grandes
Moram em casas de madeira a pique.
(...)

Atividade:
01.Os árcades, no Brasil, assinalaram as ideias neoclássicas europeias, muitas vezes reinterpretando, cada um ao seu estilo, a realidade sociopolítica e cultural do país, como se observa no trecho de Cartas Chilenas.
Todas as alternativas abaixo apresentam características desse estilo literário, presente nos versos acima citados, exceto:
a) Valorização do ideal da vida simples e tranquila.
b) Tendência ao discurso em forma de diálogo do eu-poético com um interlocutor.
c) Utilização de linguagem elegante, rebuscada e artificial.
d) Intenções didáticas, expressas no tom de denúncia e sátira.
e) Caracterização do poeta como um pintor de situações, e não de emoções.

02.Sobre o Arcadismo no Brasil, é incorreto afirmar que:
a) Cláudio Manuel da Costa, um de seus autores mais importantes, embora tenha assumido uma atitude pastoril, traz, em parte de sua obra poética, aspectos ligados à lírica camoniana.
b) Em Liras de Marília de Dirceu, Tomás Antônio Gonzaga não segue aspectos formais rígidos, como o soneto e a redondilha, em todas as partes da obra.
c) Nas Cartas Chilenas, o autor satiriza Luís da Cunha Menezes por suas arbitrariedades como navegador da capitania de Minas.
d) Basílio da Gama, em O Uruguai, seguiu a rígida estrutura camoniana de Os Lusíadas, usando versos decassílabos em oitava-rima.
e) Caramuru, como tema principal, o descobrimento da Bahia por Diogo Álvares Correia, apresentando, também, os rituais e as tradições indígenas.

                                                       FIM

sexta-feira, 29 de julho de 2011

Arcadismo - Origens e características

     O Século das luzes valorizou a vida no campo

     Se o Classicismo alorizava a perfeição formal, inspirada na compreensão racional do mundo, o Barroco mergulhava na assimetria e no exagero, dividindo entre fé e razão, matéria e espírito. Agora, em contraposição aos dilemas e excessos da linguagem do período barroco, surge mais uma vez um movimento em busca da simplicidade perdida. Trata-se do Arcadismo, que floresceu no fim do século 17 e se estendeu pelo século 18.
     Estamos falando do Século das Luzes, assim chamado por ter testemunhado o Iluminismo, movimento filosófico para o qual a felicidade só seria atingida com o progresso da civilização, apoiada pelo exercício da razão e pela liberdade de Pensamento. A burguesia, com crescente poder econômico, ganhou condições de se impor politicamente à nobreza. Abriu-se o caminho para a Revolução Francesa, de 1789.
     A nova situação favoreceu o surgimento de uma arte que, embora assimilasse o espírito crítico impulsionado pelos iluministas, exprimia-se em um contexto de racionalidade e simplicidade. O termo "arcadismo" vem de Arcádia, região que, na mitologia grega, era habitada por pastores que cultivavam a música e a poesia, valorizando a simplicidade da vida no campo. Inspiradas no , surgiram associações batizadas de Arcádias ou de Academias.
     Os excessos e desequilíbrios do Barroco foram substituídos pelas seguintes características: simplicidade da forma, uso moderado de figuras de linguagem e vocabulário rebuscado, racionalidade e recuparação das referências advindas da mitologia cláscica. Esses aspectos permitem que o Arcadismo seja sinônomo de Neoclassicismo. Eles se aplicam também aos assuntos abordados pelos poetas árcades, que buscaram lemas da Antiguidade para resumir seus ideais. Em latim, essas expressões resumem o conteúdo temático do movimento: carpe diem - aproveitar (colher) o dia; inutilia truncat - eliminar o inútil; aurea mediocritas - expressão do poeta romano Horácio, significando que uma condição mediana garante a tranquilidade; locus amoenus - local tranquilo (ameno); fugere urbem - fugir do centro urbano.
     O Arcadismo começa no Brasil com o lançamento das Obras, do poeta mineiro Cláudio Manuel da Costa. Admirador de Camões, o escritos deu preferência ao soneto lírico-amoroso. Seu estilo se mantinha bastante próximo ao Barraco, com o emprego intenso de figuras de linguagem e rebuscamentos condenados por outros árcades. Estudante de Direito em Portugal, teve contato com os iluministas e, de volta ao Brasil, participou da inconfidência Mineira. Foi preso e encontrado morto (enforcado) em sua cela. Pela versão oficial, Cláudio Manuel da Costa teria cometido suicídio.
     O outro grande autor do Arcadismo brasileiro é Tomás Antônio Gonzaga, que liderou a "Escola Mineira" ao lado de Cláudio Manuel da Costa. Os melhores exemplos de sua poesia lírica são as Liras, assinadas por seu pseudônimo árcade Dirceu, conhecidas por Marília de Dirceu, que caracterizam o eu-lírico como um pastor que declara seu amor a Marília. Gonzaga escreveu o poema em duas fases distintas da vida. Por isso, na primeira parte, ele manifesta a esperança de uma vida feliz ao lado da amada; na segunda, fala do cenário opressivo da masmorra depois de condenado ao degredo na África pela participação na Inconfidência Mineiro. O lado inconfidente de Gonzaga foi registrado na obra Cartas Chilenas.

     As faces de Bocage
     Ele foi árcade, irreverente e pré-romântico

     Em Portugal, o nome mais conhecido do Arcadismo, Manuel Maria Barbosa du Bocage, é o poeta que mais notoriamente se afastou da temática do movimento. Ele ficou célebre pela poesia satírica, mordaz e às vezes extremamente erotizada (pornográfica, segundo alguns críticos). Sua lírica conservou o bucolismo e, nos sonetos, o equilibrio formal. Mas o subjetivismo e a luta entre razão e sentimento o transformam em um pré-romântico.
Observe o soneto:

Sobre estas duras, cavernosas fragas,
Que o marinho furor vai carcamendo,
Me estão negras paixões n'alma fervendo
Como fervem no pego as crespas vagas:
Razão feroz, o coração me indagas,
De meus erros a sombra esclarecendo,
E vás nele (ai de mim!) palpando e vendo
De agudas ânsias venenosas chagas:
Cego aos meus males, surdo ao teu reclamo,
Mil objetos de horror co'a idéia eu corro,
Solto gemidos, lágrimas derramo:
Razão, de que me serve o teu socorro?
Mandas-me não amar, eu ardo, eu amo;
Dizes-me que sossegue, eu peno, eu morro.

Bocage, Soneto, in Poesia no Metrô

Atividade:

01.Leia o soneto de Cláudio Manuel da Costa que se inicia com o verso "Pastores, que levais ao monte o gado". Todas as alternativas contêm afirmações corretas sobre esse soneto, exceto:
a) O poema opõe um estilo de vida simples a um estilo de vida dissimulado.
b) A palavra "guerra" enfatiza a recusa da pastora a corresponder aos afetos do poeta.
c) O sentido da visão é o predominante em todas as estrofes do poema.
d) A expressão "para dar contágio a toda a terra" revela a intensidade do sofrimento do pastor.

02.Leia o soneto de Cláudio Manuel da Costa que se inicia com o verso "Torno a ver-nos, ó montes: o destino". Considerando o soneto e os elementos constitutivos do Arcadismo brasileiro, assinale a opção correta acerca da relação entre o poema e o momento histórico de sua produção.
a) Os "montes" e "outeiros", mencionados na primeira estrofe, são imagens relacionadas à Metrópole, ou seja, ao lugar onde o poeta se vestiu com traje "rico e fino".
b) A posição entre a Colônia e a Metrópole, como núcleo do poema, revela uma contradição vivenciada pelo poeta, dividido entre a civilidade do mundo urbano da Metrópole e a rusticidade da terra da Colônia.
c) O bucolismo presente nas imagens do poema é elemento estético do Arcadismo que evidencia a preocupação do poeta árcade em realizar uma representação literária realista da vida nacional.
d) A relação de vantagem da "choupana" sobre a "Cidade", na terceira estrofe é formulação literária que reproduz a condição histórica paradoxalmente vantajosa da Colônia sobre a Metrópole.
e) A realidade de atraso social, político e econômico do Brasil Colônia está representada esteticamente no poema pela referência, na última estrofe, à transformação do pranto em alegria.

03.Assinale a alternativa correta em relação a "Marília de Dirceu", de Tomás Antônio Ganzaga.
a) No livro, é estabelecido um contraste entre a paisagem, bucólica e amena, e o cenário da masmorra, opressivo e triste.
b) Trata-se de um conjunto de cartas de amor, enviadas por Marília, de Minas Gerais, a Dirceu, que se encontra em Moçambique.
c) Na obra, o pensamento racional é anulado em favor do sentimentalismo romântico.
d) Nas liras de Gonzaga, Marília é uma mulher irreal, incorpórea, imaginada pelo pastor Dirceu.
e) Trata-se de um livro satírico, carregado de termos pejorativos em relação às convenções da época.

04.(adaptado)
"Além do horizonte, deve ter
Algum lugar bonito para viver em paz
Onde eu possa encontrar a natureza
alegria e felicidade com certeza.
Lá nesse lugar o amanhecer é lindo
com flores festejando mais um dia que vem vindo
Onde a gente possa se deitar no campo
Se amar na relva, estutando o canto das pássaros".

Roberto e Erasmo Carlos estão falando de um lugar ideal, de um ambiente campestre, calma. Em literatura, um grupo de escritores, no século 18, defendeu o bucolismo, a necessidade de valorização da vida simples, em contato com a natureza. Estamos fazendo referência aos escritores do:
a) Romantismo.
b) Arcadismo.
c) Realismo.
d) Barroco.
d) Simbolismo.

                                                      FIM

quarta-feira, 27 de julho de 2011

Arcadismo - Soneto

SONETO
Cláudio Manuel da Costa

Pastores, que levais ao monte o gado,
Vede lá como andais por essa serra;
Que para dar contágio a toda a terra,
Basta ver-se o meu rosto magoado:

Eu ando (vós me vedes) tão pesado;
E a pastora infiel, que me faz guerra,
É a mesma, que em seu semblante encerra
A causa de um martírio tão cansado.

Se a queireis conhecer, vinde comigo,
Vereis a formosura, que eu adoro;
Mas não; tanto não sou vosso inimigo:

Deixai, não a vejais; eu vo-lo imploro;
Que se seguir quiserdes, o qual eu sigo,
Chorareis, ó pastores, o que eu choro.

SONETO
Cláudio Manuel da Costa

Torno a ver-vos, ó montes: o destino
Aqui me torna a pôr nestes outeiros,
Onde um tempo os gabões deixei grosseiros
Pelo traje da Corte, rico e fino.

Aqui estou entre Almendro, entre Corino,
Os meus fiéis, meus doces companheiros,
Vendo correr os míseros vaqueiros
Atrás de seu cansado desatino.

Se o bem desta choupana pode tanto,
Que chega a ter mais preço, e mais valia
Que, da cidade, o lisonjeiro encanto.

Aqui descanso a louca fantasia,
E o que até agora se tornava em pranto
Se converta em afetos de alegria.

MARÍLIA DE DIRCEU
Tomás Antônio Gonzaga
Parte I
Lira I

Eu, Marília, não sou algum vaqueiro,
Que viva de guardar alheio gado;
De tosco trato, d'expressões grosseiro,
Dos frios gelos, e dos sóis queimado.
Tenho próprio casal, e nele assisto;
Dá-me vinho, legume, fruta, azeite;
Das brancas ovelhinhas tiro o leite,
E mais as finas lãs, de que me visto.
Graças, Marília bela,
Graças à minha Estrela!

Eu vi o meu semblante numa fonte,
Dos anos inda não está cortado:
Os pastores, que habitam este monte,
Com tal destreza toco a sanfoninha,
Que inveja até me tem o próprio Alceste:
Ao som dela concerto a voz celeste;
Nem canto letra, que não seja minha,
Graças, Marília bela,
Graças à minha Estrela!

Atividade
01.Os trechos acima elogiam ou pelo menos fazem referência a um estilo da vida idealizado por um movimento literário em Portugal e no Brasil no século 18. Explique qual era esse estilo e por que ele representa uma ruptura com a visão de mundo do período anterior. (3 linhas)

02.Além da referência a esse estilo de vida, cite outras características presentes nos textos que identifiquem o movimento literário em questão.

                                                                FIM

quinta-feira, 14 de julho de 2011

Barroco - Gregório de Matos

     Portugueses que viviam no Brasil deram impulso à literatura nacional

     No Brasil so século 17, as escolas ainda se limitavam à educação religiosa, e a literatura ainda refletia diretamente as tendências da metrópole. Os próprios autores, às vezes, não podem ser designados definitivamente brasileiros ou portugueses. Padre Antônio Vieira, por exemplo, é considerado um escritor português por sua nacionalidade, mas passou grande parte de sua vida no Brasil e contribuiu decisivamente para a formação da literatura brasileira.
     Mesmo quem nascia no Brasil estudava em Portugal. Foi o caso de Gregório de Matos, nascido em Salvador e formado em Direito em Coimbra. Depois de se tornar juiz e ficar viúvo, voltou ao Brasil, para trabalhar na Bahia. Mas não foi a magistratura que lhe rendeu fama,, e sim a poesia. Dono de um espírito multifacetado, com grande talento para o lirismo, a religiosidade e também a sátira, Gregório de de Matos ficou conhecido pela irreverência e pelo ataque impiedoso aos costumes dos colonizadores, cléricos, governantes, nobres e mestiços. Sua produção inclui poemas líricos e religiosos de alta qualidade, refletindo as contradições e os excessos da arte barroca, mas foi a língua ferina que o celebrizou, rendendo-lhe o apelido de "Boca do Inferno".
     Na poesia lírica, Gregório segue a tendência cultista e expressa vários  sentimentos por meio de figuras de linguagem como antíteses e metáforas. Temas como a passagem do tempo, a brevidade da vida e a paixão pela mulher encantadora também são tratados de modo dramático em seus sonetos. Os elementos sensoriais têm grande importância na manifestação do eu-lírico: "Pois não me chegam a vir à boca os tiros / Dos combates, que vão dentro no peito", diz um poeta dos poemas na página à esquerda. O poeta usa a imagem de uma batalha para se referir aos sentimentos que guarda, mas não consegue expressar com palavras.
     A poesia religioso ou sacra de Gregório revela um artista abalado pelo conflito entre o mundo material e o espiritual, o pecado e a salvação. Um dos melhores exemplos é o soneto A Jesus Cristo Nosso Senhor.
     Ao mesmo tempo, o autor foi capaz de cultivar a sátira impiedosa e cruel contra instituições, autoridades e colonos gananciosos. A sociedade do Brasil colônia, que crescia sem princípios éticos sólidos e com base no enriquecimento acima de qualque outro objetivo, era fértil para a crítica mordaz do habilidoso poeta. No Juízo Anatômico da Bahia, Gregório faz uma enorme lista de virtudes ausentes na sociedade baiana.
     A defesa de Antônio Vieira do território brasileiro contra invasores estrangeiros, de um lado, e a preocupação de Gregório de Matos com o comportamento social, de outro, ilustram um fator novo surgido na literatura barroca da colônia: o nativismo, denotando um sentimento de apego e amor à terra.
     Outro nome do Barroco no Brasil é Bento Teixeira, autor de Prosopopeia, considerado o marco inaugural do período na colônia. É uma tentativa de poema épico inspirado em Os Lusíadas que narra os efeitos de Albuquerque Coelho, donatário da capitania de Pernanbuco.


     Lendo o passado
     Gregório de Matos

     "Numa suave região cortada por rios límpidos, de céu sempre azul, terra férteis, florestas frondosas, a cidade parecia ser a imagem do Paraíso. Era, no entanto, onde os demônios aliciavam almas para povoarem o inferno."
     ""Esta cidade acabou-se', pensou Gregório de Matos, olhando pela janela do sobrado no terreiro de Jesus. "Não é mais a Bahia. Antigamente havia muito respeito. Hoje, até dentro da praça, nas barbas da infantaria, nas bochechas dos granachas, fazem assaltos à vista.""
Os dois trechos acima são de Boca do Inferno, romance de Ana Mirando, publicado em 1989. As passagens ilustram dois aspectos marcantes do período Barroco. A primeira lembra a contradição entre o bem eo mal, o Paraíso e o inferno, típica do dualismo na arte do período. A segunda é uma citação direta do poeta Gregório de Matos e de suas críticas aos males da sociedade, como a currupçãp.
                                                                                                        (Romance de 1989 retrata a Bahia)


Leia trechos de três poemas de Gregório de Matos

1 - A Jesus Cristo Nosso
Pequei, Senhor, mas não porque hei pecado,
Da vossa piedade me despido,
Porque quanto mais tenho delinguido,
Vos tenho a perdoar mais empenhado.
Se basta a vos irar tanto em pecado,
A abrandar-nos sobeja um só gemido,
Que a mesma culpa, que vos há ofendido,
Vos tem para o perdão lisonjeado.
Se uma ovelha perdida, e já cobrada
Glória tal, e prazer tão repentino
vos deu, como afirmais na Sacra História:
Eu sou, Senhor, a ovelha desgarrada
Cobrai-a, e não queirais, Pastor divino,
Perder na vossa ovelha a vossa glória.

2 - Admirável Expressão que faz o Poeta de seu Silêncio
Largo em sentir, em respirar sucinto
Peno, e calo tão fino, e tão atento,
Que fazendo disfarce do tormento
Mostro, que o não padeço, e sei, que o sinto.
O mal, que fora encubro, ou que desminto,
Dentro no coração é, que o sustento,
Com que para penar é sentimento,
Para não se entender é labirinto.
Ninguém sufoca a voz nos seus retiros;
Da tempestade é o estrondo efeito (...)
Mas oh do meu segredo alto conceito!
Pois não me chegam a vir à boca os tiros
Dos combates, que vão dentro no peito

3 - Juízo Anatômico da Bahia
Que falta nesta cidade? - Verdade.
Que mais por sua desonra? - Honra.
Falta mais que se lhe ponha? - Vergonha.
O demo a viver se exponha,
Por mais que a fama a exalta,
Numa cidade onde falta
Verdade, honra, verganha.(...)

Atividade:
01.Leia o soneto Admirável Expressão. Considere as seguintes afirmações:
I. O poema é um exemplo da poesia satírica de Gregório de Matos, a qual lhe valeu a alcunha de Boca do Inferno, por escarnecer de pessoas, situações e costumes de seu tempo.
II.Na segunda estrofe, o poema expressa a oposição entre essência e aparência, sustentando que o sofrimento é ocultado aos olhos do mundo.
III.Segundo as duas últimas estrofes do poema, a opção pelo silêncio com relação à dor e às angústias internas contrapõe-se aos ruídos da natureza.
Quais as corretas:
a) Apenas I.
b) Apenas II.
c) Apenas I e II.
d) Apenas II e III.
e) I, II e III.

02.Assinale com V (verdadeiro) ou F (falso) as afirmações abaixo sobre os dois grandes nomes do barroco brasileiro.
(     ) A obra poética de Gregóriode Matos oscila entre os valores transcendentais e os valores mundanos, exemplificando as tenções do seu tempo.
(     ) Os sermões do Padre Vieira caracterizam-se por uma construção de imagens desdobradas em numerosos exemplos que visam a enfatizar o conteúdo da pregação.
(     ) Gregório de Matos e o Padre Vieira, em seus poemas e sermões, mostram exacerbados sentimentos patrióticos expressos em linguagem barroca.
(     ) A produção satírica de Gregório de Matos e o tom dos sermões do Padre Vieira representam duas faces da alma barroca no Brasil.
(     ) O poeta e o pregador alertam os contemporâneos para o desvio operado pela retórica retumbante e vazia.
A sequência correta de preenchimento dos parênteses, de cima para baixo, é:
a) V, F,  F, F, F.
b) V, V, V, V, F.
c) V, V, F, V, F.
d) F, F, V, V, V.
e) F, F, F, V, V.

                                             FIM    

quarta-feira, 13 de julho de 2011

Barroco - Origens e características

     O Barroco foi o gênero artístico predominante no Ocidente do século 17

     A origem do termo "barroco" é controversa. Ele designava uma pérola de formato irregular. Também se referia a um tipo de raciocínio que desrespeitava a lógica. E chegou a ser sinônimo de mau gosto. O fato é que o termo foi consagrado como nome do período artístico que predominou no século 17. E não por acaso. A época é marcada pelo dualismo, pela instabilidade e pela contradição na vida social e, por consequência, nas manifestações artísticas.
     Transformações econômicas, sociais e políticas abalaram a perfeição e o equilíbrio cultivados pelo Classicismo. O teocentrismo voltou a conviver com o antropocentrismo graças, em grande parte, à Contarreforma, uma reação de Roma às reformas protestantes. Resulta daí uma tensão entre os valores materiais reforçados no renascimento e os valores espirituais e morais recuperados. Portugal, em crise econômica e política, caiu sob domínio espanhol. Os jesuítas intensificaram sua campanha para monopolizar o ensino na Europa e nas colônias, enquanto a dogmática e impiedosa Inquisição imposta pela Igreja reagia à efervescência das descobertas científicas de Galileu e Newton, entre outros.
     O contexto inspira uma arte da dualidade (alma x corpo, espiritualidade x sensualidade). A pintura
acentua o contraste entre luz e sombra, cloro e escuro. A arquitetura e a escultura assumem o desequilíbrio das formas e traços, em contraposição à simetria clássica.
     A literatura barroca, além de refletir essas dualidades, caracteriza-se pelo rebuscamento e pelo exagero, como reações à dúvida e à contradição. Por isso, emprega intensamente a linguagem figurada. Ao lado desse recurso, os autores utilizam o encadeamento lógico de ideias, com raciocínios retóricos e complexos, que tornavam as formas elaboradas e rebuscadas. Esses dois aspectos principais - a linguagem figurada e o artefício retórico - permitem a divisão da produção barroca entre o ocultismo e o conceptismo. O cultismo, também chamado de gongorismo por resultar da influência do autor espanhol Luís de Góngora y Argote, valoriza as imagens poéticas, especialmente as visuais, do mesmo modo como faz o maior autor do Barroco brasileiro, Gregório de Matos. No conceptismo, também conhecido como quevedismo, graças a outro espanhol, Francisco de Quevedo y Villegas, a preocupação é o encadeamento de ideias, a argumentação. Mas o conceptismo também recorre a figuras de linguagem, especialmente a metáfora, a parábola e a alegoria (a representação de pensamentos ou fatos de forma figurada, em que cada um dos diversos elementos utilizados funciona como substituto). O seguidor mais célebre dessa tendência é Antônio Vieira.
    Nascido em Portugal e criado no Brasil, o jesuíta Antônio Vieira usou seus sermões, verdadeiras obras-primas de argumentação e também de arte literária, para várias fins, entre eles pregar a fé cristã; criticar a escravização dos índios; censurar os colonos, por estarem distanciados da missão católica; e ensinar a arte de pregar a outros religiosos. Suas obras se caracterizam pela argumentação complexa e pelo uso sofisticado de metáforas, alegorias e analogias com passagens bíblicas. Destacam-se:
     * Sermão da Sexagésima, sobre a arte de pregar (sexagésima, pelo calendário litúrgico da época, era o penúltimo domingo antes da quaresma).
     * Sermão de Santo Antônio (aos peixes), criticando a insensibilidade dos colonos.
     * Sermão pelo Bom Sucesso das Armas de Portugal Contra as de Holanda, opondo-se à invasão holandesa.
     Outros autores que merecem destaque são: Francisco Manuel de Melo, Antônio José da Silva, "o judeu", e sóror Mariana do Alcoforado.

     Nota: Observe a lista de dualismos e contrastes na estética barroca.
     *Paganismo x Religiosidade
     *Razão x Fé
     *Vida x Morte
     *Pecado x Perdão
     *Claro x Escuro
     *Luz x Sombra
     *Equilíbrio x Instabilidade
     *Simetria x Assimetria
     *Sobriedade x Rebuscamento
     *Austeridade x Exagero
     *Racionalidade x Sensualismo

     Atividade:
01.Um dos recursos utilizados pelo padre Antônio Vieira em seus sermões consiste na "agudeza" - maneira de conduzir o pensamento que aproxima objetos e/ou ideias distantes, diferentes, por meio de um discurso artificioso, que se costuma chamar de "discurso engenhoso".
Assinale a alternativa em que, no trecho transcrito do Sermão da Sexagésima, o autor utiliza esse recurso.
a) Lede as histórias eclesiásticas, e achá-las-ei todas cheias de admiráveis efeitos da pregação da palavra de Deus. Tantos pecadores convertidos, tanta mudança de vida, tanta reformação de costumes; os grandes desprezando as riquezas e vaidades do Mundo; os reis renunciando os cetros e as coroas; as mocidades e as gentilezas metendo-se pelos desertos e pelas vocas [...]
b) Miseráveis de nós, e miseráveis de nossos tempos, pois neles se veio cumprir a profecia de S. Paulo: [...] "Virá tempo, diz S. Paulo, em que os homens não sofrerão a doutrina sã." [...] "Mas para seu apetite terão grande número de pregadores feitos a montão e sem escolha, os quais não façam mais que adular-lhes as orelhas."
c) Para um homem se ver a si mesmo são necessárias três coisas: olhos, espelho e luz. [...] Que coisa é a conversão de uma alma, senão entrar um homem dentro de si e ver-se a si mesmo? Para esta vista são necessários olhos, é necessária luz e é necessário espelho. O pregador concorre com o espelho, que é a doutrina; Deus concorre com a luz, que é a graça; o homem concorre com os olhos, que é o conhecimento.
d) Quando Davi saiu a campo com o gigante, ofereceu-lh Saul as suas armas, mas ele não as quis aceitar. Com as armas alheias ninguém pode vencer, ainda que seja Davi. As armas de Saul só servem a Saul, e as de Davi a Davi, e mais aproveita um cajado e uma funda própria, que a espada e a lança alheia.

02.Considere as seguintes afirmações sobre o padre Antônio Vieira.
I.   Possui um estilo antigongórico, conceptista, caracterizado pela clareza e pelo rigor sintático, dialético e lógico.
II.  Recusa, como cultista, o elemento imaginístico, transformando-o em mero instrumento de convencimento dos fiéis.
III. Recontextualiza passagens do Evangelho, uma vez que as vincula às ideias que quer expressar, explorando a analogia.
Quais estão corretas?
a) Apenas I.
b) Apenas II.
c) Apenas I e III.
d) Apenas II e III.
e) I, II e III

03.Foi um movimento literário do século 17, nascido da crise de valores renascentistas. Caracteriza-se na literatura pelo culto dos contrastes, a preocupação com o pormenor e a sobrecarga de figuras como a metáfora, as antíteses, hipérboles e alegorias. Essa linguagem conflituosa reflete a consciência dos estados contraditórios da condição humana.
Trata-se do:
a) Romantismo.
b) Trovadorismo.
c) Humanismo
d) Realismo
d) Barroco.

                                                                          FIM 

sábado, 9 de julho de 2011

Barroco - O Sermão da Sexagésima

     O Sermão da Sexagésima, do Padre Antônio Vieira

     "(...) Fazer pouco fruto a palavra de Deus no Mundo, pode proceder de um de três princípios: ou da parte do pregador, ou da parte do ouvinte, ou da parte de Deus. Para uma alma se converter por meio de um sermão, há-de haver três concursos: há-de concorrer o pregador com a doutrina, persuadindo: há-de concorrer o ouvinte com o entendimento, percebendo; há-de concorrer Deus com a graça, alumiando. Para o homem se ver a si mesmo, são necessárias três coisas: olhos, espelho e luz. Se tem espelho e é cego, não se pode ver por falta de olhos; se tem espelho e olhos, e é de noite, não se pode ver por falta de luz. Logo, há mister luz, há mister espelho e há mister olhos. Que coisa é a conversão de uma alma, senão entrar um homem dentro em si e ver-se a si mesmo? Para esta vista são necessários olhos, é necessária luz e é necessário espelho. O pregador concorre com o espelho, que é a doutrina; Deus concorre com a luz, que é a graça; o homem concorre com os olhos, que é o conhecimento. Ora suposto que a conversão das almas por meio da pregação depende destrês concursos: de Deus, do pregador e do ouvinte, por qual deles devemos entender que falta? Por parte do ouvinte, ou da parte do pregador, ou por parte de Deus? (...)
     Sendo, pois, certo que a palavra divina não deixa de frutificar por parte de Deus, segue-se que ou é por falta do pregador ou por falta dos ouvintes. Por qual será? Os pregadores deitam a culpa aos ouvintes, mas não é assim. Se fora por parte dos ouvintes, não fizera a palavra de Deus muito grande fruto, mas não fazer nenhum fruto e nenhum efeito, não é por parte dos ouvintes. Provo.
     Os ouvintes ou são maus ou são bons; se são bons, faz neles fruto a palavra de Deus; se são maus, ainda que não faça neles fruto, faz efeito. (...) Ouvintes de entendimentos agudos e ouvintes de vontades endurecidas são os piores que há. Os ouvintes de entendimentos agudos são maus ouvintes, porque vêm só a ouvir sutilizes, a esperar galantarias, a avaliar pensamentos, e às vezes também a picar a quem os não pica. (...)
     Pudéramos arguir ao lavrador do Evangelho de não cortar os espinhos e de não arrancar as pedras e os espinhos, para que se visse a força do que semeava. É tanta força da divina palavra, que, sem cortar nem despontar espinhos, nasce entre espinhos. É tanta a força da divina palavra, que, sem arrancar nem abrandar pedras,nasce nas pedras. Corações embaraçados como espinhos, corações secos e duros como pedras, ouvi a palavra de Deus e tende confiança! Tomai exemplo nessas mesmas pedras e nesses espinhos! Esses espinhos e essas pedras agora resistem ao semeador do Céu; mas virá tempo em que essas mesmas pedras o aclamem e esses mesmos espinhos o coroem.
     Quando o semeador do Céu deixou o campo, saindo deste Mundo, as pedras se quebraram para lhe fazerem aclamações, e os espinhos se tecerem para lhe fazerem coroa. E se a palavra de Deus até dos espinhos e das pedras triunfa; se a palavra de Deus até nas pedras, até nos espinhos nasce; não triunfar dosalvedrios hoje a palavra de Deus, nem nascer nos corações, não é por culpa, nem por indisposição dos ouvintes.
    Supostas estas duas demonstrações; suposto que o fruto e efeitos da palavra de Deus, não fica, nem por parte de Deus, nem por parte dos ouvintes, segue-se por consequência clara, que fida por parte do pregador. E assim é. Sabeis, cristãos, porque não faz fruto a palavra de Deus? Por culpa dos pregadores. Sabeis, pregadores, porque não faz fruto a palavra de Deus? - Por culpa nossa. (...)"

Sermão da Sexagésima, de Padre Antônio Vieira

Atividade:

01.Como é característico em seus famosos sermões, o Padre Antônio Vieira defende aqui uma tese. Qual é o tema discutido, quais são as hipóteses e qual a conclusão?

02.Há várias metáforas no texto. Explique o significado desses dois grupos: olhos-espelho-luz; e semente-pedra-espinho. Os grupos constituem alegorias? Qual seu significado?

                                                                 FIM
   

sexta-feira, 8 de julho de 2011

Renascimento - literatura de informação e de catequese

     O descobrimento de novas terras trouxe a literatura ocidental para nosso país


     Enquanto a cultura renascentista ampliava os limites do conhecimento humano, as grandes navegações expandiam os horizontes do mundo físico. As conquistas promovidas pelos reis portugueses,  no processo de colonização, tinham duplo objetivo. Um era conquistar terras e apoderar-se de suas riquezas, subjugando os povos nativos. Outro era disseminar a doutrina católica e a influência da Igreja catequizando os nativos, chamados de pagãos por não terem sido batizados.
     É nesse momento que surge a primeira manifestação literária da história brasileira: a Carta a El-Rei Dom Manuel sobre o Achamento do Brasil, de ero Vaz de Caminha, escrivão da esquadra de Pedro Álvares Cabral em 1500, ano oficial do descobrimento do . Muitos não consideram a carta um exemplo de literatura brasileira propriamente dita, mas apenas literatura escrita no Brasil por um português.
     De qualquer modo, a obra é um dos melhores exemplos da literatura de informação, constituída de relatos de viagens e tratads sobre a nova terra escritos por europeus. A finalidade da Carta era informar a metrópole sobre as viagens e os contatos com o território e os nativos, mas Caminha tinha pretenções literárias ao descrever algumas cenas de modo comparativo e metafórico.
     Outras produções importantes da literatura informativa no Brasil colônia do século 16 são: Diário de Navegação, de Pero Lopes de Sousa; Tratado da Terra do Brasil e História da Província de Santa Cruz, a que Vulgarmente chamamos Brasil, de Pero de Magalhães Gândavo; Tratado da Terra e Gente do Brasil, de Fernão Cardim; Tratado Descritivo do Brasil, de Gabriel Soares de Sousa; Diálogos das Grandezas do Brasil, de Ambrósio Fernandes Brandão; Duas Viagens ao Brasil, de Hans Staden; e Viagem à Terra do Brasil, de Jean de Léry.
     Ao lado dessa literatura essencialmente descritiva, desenvolveu-se a de catequese, de autoria dos jesuítas que vieram para o Brasil com a missão de doutrinar os índios na fé católica. A fim de converter os "selvagens" locais, os jesuítas escreveram cartas, tratados descritivos, crônicas, poemas, hinos e peças teatrais. Destaca-se a produção dos padres Manuel da Nóbrega, Fernão Cardim e, principalmente, José de Anchieta.
     Hábil no uso da literatura para a catequização, Anchieta escreveu vários tipos de textos, entre eles poemas, uma gramática da língua tupi e peças teatrais. A exemplo dos autos medievais de Gil Vicente, o teatro de Anchieta promove o respeito aos valores morais cristãos como caminha para a salvação.

     Contatos imediatos

     Leias os textos abaixo de Pero Vaz de Caminha e José de Anchieta sobre o Brasil

1.  "Esta terra, Senhor, me parece que ela da ponta que mais contra o sul vimos até outra ponta contra o norte vem, de que nós deste porto houvemos vista, será tamanha que haverá nela bem vinte ou vinte e cinco léguas de costa. Tem, ao longo do mar, nalgumas partes, grandes barreiras, delas vermelhas, delas brancas; e a terra por cima toda chã e muito cheia de grandes arvoredos. De ponta a ponta, é tudo praia-palma, muito chã e muito formosa.
     Águas são muitas; infindas. E em tal maneira é graciosa que, querendo-a aproveitar, dar-se-á nela tudo, por bem das águas que tem. Porém o melhor fruito, que dela se pode tirar me parece que será salvar esta gente. E esta deve ser a principal semente que Vossa Alteza el ela deve lançar.
     A feição deles é serem pardos, maneira de avermelhados, de bons rostos e bons narizes, benfeitos. Andam nus, sem coberta alguma. Não fazem o menor caso de encobrir ou de mostrar suas vergonhas; e nisso têm tanta inocência como em mostrar o rosto.
     Parece-me gente de tal inocência que, se homem os entendesse e ele a nós, seriam logo cristãos, porque eles, segundo parece, não têm, nem entendem em nenhuma crença.
     Eles não lavram, nem criam. Não há aqui boi, nem vaca, nem cabra, nem ovelha, nem galinha,nem qualquer outra alimária, que costumada seja ao viver dos homens. Nem comem senão desse inhame, que aqui há muito, e dessa semente e fruitos, que a terra e as árvores de si lançam. E com isto andam tais e tão rijos e tão nédios que o não somos nós tanto, com quanto trigo e legumes comemos.
     E nesta maneira, Senhor, dou aqui a Vossa Alteza conta do que nesta terra vi. E, se algum pouco me alongei, Ela me perdoe, pois o desejo que tinha de tudo vos dizer, mo fez pôe assim pelo miúdo."

A Carta de Pero Vaz de Caminha, de Pero Vaz de Caminha, 1943

2.  "Por aqui se vê que os maiores impedimentos nascem dos Portugueses, e o primeiro é não haver neles zelo de salvação dos índios (...) e com isso pouco se lhes dá aos senhores que têm escravos, que não ouçam missa, nem se confessam, e estejam amancebados. E, se o fazem, é pelos contínuos brados da Companhia, e logo se enxerga claro nos tementes a Deus que seus escravos vivem diferentemente pelo particular cuidado que têm deles."

José de Anchieta, 1584

Atividade:

01.A partir da leitura dos trechos de Pero Vaz de Caminha, julgue os itens a seguir.
I.   Diferentemente de outros documentos do século 16 acerca da descoberta do Brasil, hoje esquecidos, a carta de Pero Vaz de Caminha continua a ser lida devido à sua importância histórica e, também, por conter elementos da função poética da linguagem.
II.  A carta de Pero Vaz de Caminha é considerada pela história brasileira o primeiro documento publicitário oficial do país.
III. A carta de Caminha é um texto essencialmente descritivo.
IV. Pero Vaz de Caminha foi o único português a enviar notícias da descoberta do Brasil ao rei de Portugal.
V.  Segundo Caminha, os habitantes da Ilha de Vera Cruz eram desaverganhodos.
São verdadeiros os itens:
a) I, II e V.
b) II e III.
c) I e III.
d) I e IV.
e) II, III e V.

02.O padre José de Anchieta escreveu sobre as dificuldades de conversão dos índios ao cristianismo. Pela leitura do trecho, é correto afirmar que o jesuíta:
a) entendia que a escravidão não poderia se tornar um obstáculo à colonização do gentio.
b) opunha-se à escravização dos índios por julgá-la contrária aos princípios do cristianismo.
c) considerava os costumes tradicionais indígenas adequados aos mandamentos cristãos.
d) julgava os indígenas ociosos e inaptos para o trabalho na grande empresa agrícola.
e) advogava a sujeição dos índios aos portugueses como meio para facilitar a sua conversão.

     FIM
                           

quarta-feira, 6 de julho de 2011

Renascimento - Luís de Camões

     Com o Renascimento, os artistas reencontraram os valores do antropocentrismos

     As mudanças de valores iniciadas no Humanismo foram consolidadas no Renascimento, no século 16. O nome indica o ressurgimento dos modelos culturais da Antiguidade clássica. O Classicismo, também chamado de Quinhentismo por ter ocorrido nos anos 1500, refere-se às manifestações artísticas do período histórico renascentista. O antropocentrismo tomou o lugar do teocentrismo na visão de mundo. A fé nos valores religiosos e metafísicos foi substituída pela razão como principal ferramenta para explicar o funcionamento da natureza e as inquietações humanas.
     No plano social e político, os valores medievais e a influência da igreja foram sacudidos pela Reforma Protestante, que contestou o poder do papa e de Roma sobre a Europa. Com a expansão marítma, Portugal, Espanha e Inglaterra se estabeleceram como potências mercantis, reforçando o poder dos reis e da burguesia comercial.
     Enquanto isso, a Itália mostrou-se um terreno fértil para reviravoltas no conhecimento. No campo filosófico,renasceu o idealismo do grego Platão, para quem o mundo material era um reflexo imperfeito do mundo das ideias. Na ciência, a cultura clássica forneceu o modelo para o conhecimento baseado na razão. As manifestações artísticas se caracterizaram pela busca da perfeição formal, guiada por relações lógicas entre as partes que formavam o todo. O ideal grego do equilíbrio entre a razão e emoção se traduziu na proporcionalidade das medidas.
     Os renascentistas também retomaram a mitologia clássica como tema na criação artística. Os deuses gregos e romanos, com características humanas, passaram a povoar quadros e textos literários, interferindo no destino dos personagens. Esses deuses, contudo, não suplantaram a fé cristã, mantida pela maioria dos artistas.
     A Itália exportou essa riqueza cultural para o restante da Europa. Em Portugal, considera-se que o Classicismo começou em 1527, quando o poeta Sá de Miranda voltou da Itália trazendo as novas formas literárias. A produção em prosa foi limitada, destacando-se Menina e Moça, novela de autoria atribuída a Bernardim Ribeiro, traz um diálogo sentimental entre as personagens do título. Já na poesia, as obras e as formas se multiplicaram. ressurgiram o verso decassílabo (com dez sílabas métricas), chamado de medida nova, e formas como a epopeia (narração de aventuras históricas e façanhas heroicas), a ode (reflexões religiosas, filosóficas e sentimentais), a elegia (lamento da morte de alguém) e a écloga (poema pastoril).
     O soneto é a forma mais característica do Classicismo. É constituído de duas estrofes de quatro versos e duas estrofes de três versos, normalmente decassílabos. É comum o verso final resumir a ideia central do poema.
     O grande nome do Classicismo português é Luís Vaz de Camões, cuja obra poética se divide em duas partes:
     *Lírica, constituída por sonetos e outras formas. Os principais temas são o amor e o desconcerto do mundo.
     *Os Lusíadas, poema épico sobre a viagem de Vasco da Gama ao Oriente. O texto obedece às regras clássicas: os versos são decassílabos; cada conjunto de oito versos forma uma estrofe, organizada no esquema chamado de oitava-rima (AB AB AB CC).

     A estrutura de Os Lusíadas

     O poema é formado por 1102 estrofes, que se agrupam em dez cantos.

     PROPOSIÇÃO (Canto I, estrofes 1 a 3)
     A seção apresenta o tema: a viagem de Vasco da Gama às Índias e às glórias do povo português, comandado por seus reis, que espalharam a fé pelo mundo.
     INVOCAÇÃO (Canto I, estrofes 4 e 5)
     Camões invoca as musas do rio Tejo, as Tágides, em um dos vários exemplos de inspiração na cultura greco-romana.
     DEDICATÓRIA (Canto I, estrofes 6 a 17)
     O autor dedica a obra ao rei dom Sebastião, a quem confia a continuação das glórias e conquistas que serão narradas em seguida.
     NARRAÇÃO (do Canto I, estrofe 18, ao Canto X, estrofe 144)
     Conta a história da navegação às Índias. Entre várias aventuras, três episódios se destacam:
     *Inês de Castro - É a famosa história do amor proibido entre Inês e o príncipe dom Pedro. É uma passagem lírica dentro da epopeia.
     *O Velho e Restelo - Na praia lisboeta do Restelo, um velho denuncia a expansão marítima como uma ofensa aos princípios cristãos, pois a busca da glória em terras distantes a vida de privações pregada pela doutrina católica.
     *O Gigante Adamastor - Esse ser da mitologia grega personifica o Cabo das Tormentas, ou Cabo da Boa Esperança, grande obstáculo no caminho do Oriente. Vasco da Gama e seus marinheiros o superam
     EPÍLOGO (Canto X, estrofes 145 a 156)
     Camões lamenta a decadência do império, prevendo que as riquezas obtidas não serão suficientes para mantê-lo.

     Atividade:
01.Os Lusíadas, de Camões, ilustram o gênero épico na poesia portuguesa, mas oferecem momentos em que o lirismo se expande, humanizando os versos. Um deles é o episódio de Inês de Castro. Desse episódio, como um todo,é possível afirmar que:
a) personifica e axalta o Amor, mais forte que as conveniências e causa da tragédia de Inês.
b) celebra os amores secretos de Inês e de D. Pedro e o casamento solene e festivo de ambos.
c) tem como tema básico a vida simples de Inês de Castro, legítima herdeira do trono de Portugal.
d) retrata a beleza de Inês, posta em sossego, ensinando aos montes o nome que no peito escrito tinha.
e) relata em versos livres a paixão de Inês pela natureza e pelos filhos e sua elevação ao trono português.

02.Na passagem conhecida como "O Velho do Restelo", nos Lusíadas, o velho:
a) abençoa os marinheiros portugueses que vão atravessar os mares à procura de uma vida melhor.
b) critica as navegações portuguesas por considerar que elas se baseiam na cobiça e busca de fama.
c) emociona-se com a saída dos portugueses que vão atravessar os mares ate chagar às Índias.
d) destrata os marinheiros por não o terem convidado a participar de tão importante empresa.
e) adverte os marinheiros portugueses dos perigos que eles podem encontrar para buscar fama em outras terras.

03.Leia o soneto a seguir, de Luís de Camões.

Um mover de olhos, brando e piedoso,
sem ver de quê; um riso brando e honesto,
quase forçado, um doce e humilde gesto,
de qualquer alegria duvidoso;

um despejo quieto e vergonhoso;
um desejo gravíssimo e modesto;
uma pura bondade manifesto
indício da alma, limpo e gracioso;

um encolhido ousar, uma brandura;
um medo sem ter culpa, um ar sereno;
um longo e obediente sofrimento:

Esta foi a celeste formosura
da minha Circe, e o mágico veneno
que pôde transformar meu pensamento.


Em relação ao poema acima, considere as seguintes afirmações.
I.   O poeta elabora um modelo de mulher perfeita e superior, idealizando a figura feminina.
II.  O poeta não se deixa seduzir pela beleza feminina, assumindo uma atitude de insensibilidade.
III. O poeta sugere o desejo erótico ao se referir à figura mitológica de Circe.
Quais estão corretas:
a) Apenas I.
b) Apenas III.
c) Apenas I e II.
d) Apenas I e III.
d) I, II e III.

                                                              FIM

segunda-feira, 4 de julho de 2011

Classicismo - Os Lusíadas

Os Lusíadas
de Luís Vaz de Camões

A   As armas e os Barões assinalados
B   Que da Ocidental praia Lusitana
A   Por mares nunca dantes navegados
B   Passaram ainda além da Taprobana,*
A   Em perigos e guerras esforçados
B   Mais do que prometia a força humana,
C   E entre gente remota edificaram
C   Novo Reino, que tanto sublimaram;

E também as memórias gloriosas
Daqueles Reis que foram dilatando
A fé, o Império, e as terras viciosas
De África e de Ásia andaram devastando,
E aqueles que por obras valerosas
Se vão da lei da Morte libertando,
Cantando espalharei por toda parte,
Se a tanto me ajudar o engenho e arte.

Cessem do sábio Grego e do Troiano
As navegaçalexandro e de Trajano
Cale-se de Alexandro e de Trajano
A fama das vitórias que tiveram;
Que eu canto o peito ilustre Lusitano,
A quem Neptuno e Marte obedeceram.
Cesse tudo o que a Musa antiga canta,
Que outro valor mais alto se alevanta.

(...)

*Taprobana: ilha do Ceilão, limite oriental
do mundo conhecido na época
                        ***
(...)
"Tu só, tu, puro Amor, com força crua,
Que os corações humanos tanto obriga,
Deste causa à molesta morte sua,
Como se fora pérfida inimiga.
Se dizem, fero Amor, que a sede tua
Nem com lágrimas tristes se mitiga,
É porque queres, áspero e tirano,
Tuas aras banhar em sangue humano.

Estavas, linda Inês, posta em sossego,
De teus anos colhendo doce fruto,
Naquele engano da alma, ledo e cego,
Que a Fortuna não deixa durar muito,
Nos saudosos campos do Mondego,
De teus fermosos olhos nunca enxuto,
Aos montes ensinando e às ervinhas
O nome que no peito escrito tinhas
(...)
                     ***
(...)

- Ó gloria de mandar, ó vã cobiça
Desta vaidade a quem chamamos Fama!
Ó fraudulento gosto, que se atiça
Cua aura popular, que honra se chama!
Que castigo tamanho e que justiça
Fazes no peito vão que muito te ama!
Que mortes, que perigos, que tormentas,
Que crueldades neles experimentas!
(...)
Luís Vaz de Camões

Atividade:

01.O primeiro trecho apresenta as três estrofes iniciais de Os Lusíadas, que constituem a parte conhecida como Proposição. Quais são os fatos que Camões anuncia nesses versos? Com qual finalidade ele cita vários personagens de outra época?

02.O segundo e o terceiro trechos representam dois conhecidos episódios na narrativa. Quais são eles e qual sua importância?


                                                                    FIM

Humanismo - A crítica de Gil Vicente

     O inventor do teatro português usava tipos sociais como personagens

     Nascido em 1465, Gil Vicente é considerado o criador do teatro português. Antes de sua estreia, em 1502, com a peça monólogo do Vaqueiro (também conhecida como Auto da Visitação), ja ocorriam manifestações teatrais em Portugal. Mas eram apenas encenações de textos que não haviam sido produzidos especialmente para o palco. Vicente foi também poeta lírico e está representado no Cancioneiro Geral, de Garcia de Resende, mas é conhecido principalmente pelas 44 peças teatrais de diversos temas.
     Os conflitos morais e religiosos característicos do Humanismo estão plenamente registrados no teatro de Gil Vicente. Livres das imposições da Igreja, seus personagens frequentemente se dividiam entre viver de acordo com os mandamentos cristãos, garantindo a salvação, e render-se aos bens materiais, correndo o risco de ir para o inferno.
     Os personagens não representam indivíduos definidos, e sim tipos sociais. Ou seja, não têm características psicológicas particulares. Servem como espécies de modelo, para exemplificar qual era, segundo o autor, o comportamento de determinados setores da sociedade da época. Por isso, são chamados de personagens alegóricos. As alegorias representam situações ou um setor social. Em uma das peças mais conhecidas de Gil Vicente, Auto da Barca do Inferno, por exemplo, um fidalgo com um pajem e uma cadeira são uma alegoria para toda a nobreza ociosa de Portugal. Em Auto da Lusitânia, os personagens Todo o Mundo e Ninguém são alegorias que se explicam pelo nome.
     A obra vicentina divide-se em autos, que, criticam, em tom de sátira, os costumes da sociedade da época.
     Nos autos, os conflitos religiosos são vividos por personagens bíblicos, e os enredos são moralizantes. Contando a história de pessoas que são tentadas pelos demônios a seguir o caminho do mal, Gil Vicente busca reafirmar os valores cristãos fragilizados. Em Auto da Barca do Inferno, vários tipos sociais são submetidos a um interrogatório, após o qual são levados pelo Diabo em sua barca para o inferno ou pelo Anjo em sua barca para o Paraíso. Um a um, os personagens conversam com o Diabo e o Anjo, o que resulta em uma estrutura bastante esquemática da peça, outra característica do teatro vicentino. São absolvidos apenas um parvo, por pecar sem consciência, e quatro cavaleiros, que morreram combatendo os infiéis.
     Nas farsas, o autor ridiculariza personagens que não agem conforme os princípios das instituições às quais pertencem, como o padre que sucumbe à ganância ou o escudeiro que foge da batalha.
     Entre suas obras também se destacam o Auto da Fé, O Velho da Horta, A Farsa de Inês Pereira e os demais autos que, com Auto da Barca do Inferno, completam a "Trilogia das barcas": Auto da Barca do Purgatório e Auto da Barca da Glória.
     Embora escritas há quase cinco séculos, as peças de Gil Vicente retratam dilemas morais e conflitos sociais que ainda estão presentes no mundo contemporâneo. Também a forma como esses conflitos são tratados encontra eco nos séculos seguintes.
     Um exemplo é Auto da Compadecida, escrito em 1955 pelo paraibano Ariano Suassuna.(foi adaptada para o cinema). A peça de Suassuna, ambientada no sertão nordestino, estabelece um paralelo com Auto da Barca do Inferno, de Gil Vicente, ao retratar personagens que, ao morrer, são julgados por seus pecados. Em ambos os autos, os tipos humanos mais humildes e submissos à moral religiosa, que pecam sem maldade, conseguem a salvação.

     Atividade:

Auto da Lusitânia

(...)

Entro TODO O MUNDO, homem rico mercador, e faz que anda buscando alguma coisa que se lhe perdeu; e algo após ele um homem, vestido como padre, este se chama NINGUÉM, e diz:

NINGUÉM:
Que andas tu aí buscando?

TODO O MUNDO:
Mil cousas ando a buscar:
delas não posso achar,
porém ando porfiando.
por quão bom é porfiar.

NINGUÉM:
como hás o nome, cavaleiro?

TODO O MUNDO:
Eu hei nome Todo o Mundo,
e meu tempo todo inteiro
sempre é buscar dinheiro,
e sempre nisto me fundo.

NINGUÉM:
Eu hei Ninguém,
e busco a consciência.

BELZEBU:
Esta é boa experiência:
Dinato, escreve isto bem.

DINATO:
Que escreverei, companheiro?

BELZEBU:
Que ninguém busca consciência,
e Todo o Mundo dinheiro.

(...)

BELZEBU:
Escreve lá outra sorte.

DINATO:
Que sorte?

BELZEBU:
Muita garrida
Todo o Mundo busca vida,
e Ninguém conhece a morte.

TODO O MUNDO:
E mais queria o paraíso,
sem mo ninguém estovar.

NINGUÉM:
E eu ponho-me a pagar
quanto devo para isso.

BELZEBU:
Escreve com muito aviso.

DINATO:
Que escreverei.

BELZEBU:
Escreve
Que todo mundo quer paraíso,
e Ninguém paga o que deve.(...)

Gil Vicente

01.Sobre o Auto da Lusitânia, de Gil Vicente, é correto afirmar que:
a) as personagens Todo o Mundo e Ninguém são sobrenaturais.
b) as personagens Todo o Mundo e Ninguém são alegóricas.
c) o texto pertence ao Classicismo.
d) o texto pertence à primeira fase do Romantismo português.
e) o texto pertence à fase final do Trovadorismo.

02.O trecho do Auto da Lusitânia apresentado afirma que:
a) a personagem Todo o Mundo é mentirosa.
b) todos os membros da sociedade são mentirosos.
c) Belzebu não acredita nas outras personagens.
d) a personagem Ninguém não quer admitir seus erros.
e) a personagem Todo o Mundo não deseja o paraíso.

     FIM 

domingo, 3 de julho de 2011

Humanismo: Crônica e poesia

     Com a diminuição do poder da Igreja, a poesia voltada para a religião deu lugar ao Humanismo

     Do início do século 15 ao início do 16, período conhecido como Humanismo, a Europa medieval experimentou mudanças em todos os setores da atividade humana. Grandes descobertas científicas permitiram a expansão das fronteiras do mundo conhecido. O contato com outros povos favoreceu o comércio e o surgimento das cidades. As riquezas, antes concentradas nas mãos da nobreza e do clero, agora estavam ao alcance de uma nascente burguesia.
     O avanço científico foi acompanhado pelo surgimento de uma nova visão de mundo, cada vez mais afastada da confiança cega na providência divina. O teocentrismo deu lugar ao antropocentrismo, no qual o ser humano valorizou a própria capacidade intelectual. O Humanismo foi também um período de redescoberta e choques. A queda dos antigos valores e a busca de conhecimento na rica cultura da Antiguidade greco-latina, anterior ao cristianismo, motivaram conflitos morais e espirituais, refletidos pela arte. As Proporções do Corpo Humano, desenho de Leonardo da Vinci de cerca de 1490, são um reflexo e um marco do Humanismo. Da Vinci se inspirou nos estudos de proporção do arquiteto romano Marcus Vitruvius Pollio, que viveu na época de Cristo e foi redescoberto em 1415.
     Na literatura portuguesa, a poesia se desvinculou do acompanhamento musical trovadoresco e aprofundou a descrição dos sentimentos humanos. Já a prosa se consolidou no registro sistemático dos principais acontecimentos da história de Portugal. E o contexto favoreceu ainda o surgimento de um teatro de caráter popular, cujo maior autor foi Gil Vicente.
     Os portugueses viveram também uma mudança política histórica com a Revolução de Avis, que resultou na aliança entre o rei e a crescente burguesia mercantil. Surgiu uma nova ordem social que impulsionou o desenvolvimento econômico e a expanção ultramarina. Com a conquista de Ceuta, na costa do Marrocos, em 1415, Portugal deu início à caminhada de um século rumo a seu apogeu.

     A crônica histórica

     O registro dos eventos históricos foi a principal manifestação em prosa da literatura humanista portuguesa. Fernão Lopes, nomeado cronista-mor do Reino em 1434, elevou o gênero à categoria de literatura com seu estilo elegante e sua visão abrangente e crítica. Em vez de se limitar a narrar os acontecimentos palacianos do ponto de vista da nobreza, Lopes analisou os diversos setores da sociedade portuguesa, sublinhando as ambições e fraquezas dos reis, a importância dos fatores econômicos e o papel e os ensaios do povo, que chamava de "arraia-miúda". Todos esses elementos podem ser encontrados nas três grandes obras deixadas pelo historiador: Crônica de El-Rei D. Pedro, Crônica de El-Rei D. Fernando e a primeira e a segunda partes da Crônica de El-Rei D. João.

     A poesia enriquecida

     Além de ser tornar independente em relação à música e passar a ser recitada, a poesia humanística, também conhecida como poesia palaciana, ganhou novos elementos no conteúdo e na forma. Surgiram as redondilhas, poemas de forma fixa com versos de cinco sílabas (redondilhas menor) ou sete (redondilha maior). O amor continuou como o principal tema lírico, mas deixou de ser totalmente subordinado a uma dama inatingível. Sentimentos mais íntimos e profundos surgiram nos poemas, que também ilustraram os conflitos interiores do poeta. E outros assuntos ganharam espaço, em poemas não apenas líricos e satíricos, mas também religiosos, dramáticos, heroicos e didáticos. A principal produção do século 15 foi reunida por Garcia de Resende no Cancioneiro Geral, com cerca de 1000 poemas de 286 autores.

     Uma estranha sensação
          Sá de Miranda

Comigo me desavim,
Sou posto em todo perigo;
não posso viver comigo
nem posso fugir de mim.

Com dor, da gente fugia,
antes que esta assim
crescesse;
agora já fugiria
de mim, se de mim pudesse.

Que meio espero ou que fim
do vão trabalho que sigo,
pois que trago a mim comigo
tamanho imigo de mim?

Glossário
imigo - inimigo  

Atividade:

01.Cantiga sua partindo-se
Senhora, partem tão tristes
meus olhos porvós, meu bem.
que nunca tão tristes vistes
outros nenhuns por ninguém.

Tão tristes, tão saudosos,
tão doentes da partida,
tão cansados e chorosos,
da morte mais desejosos
cem mil vezes que da vida.
Partem tão tristes os tristes,
tão fora d'esperar bem,
que nunca tão tristes vistes
outros nenhuns por ninguém.

João Ruiz Castelo Branco

Sobre a cantiga acima, de João Ruiz de Castelo Branco é incorreto afirmar que:
a) representa a poesia do Humanismo em Portugal, na transição da Idade Média para a Idade Moderna.
b) comparada com as cantigas trovadorescas mostra mais intimidade do amante em relação à mulher amada.
c) é uma redondilha maior, com versos de sete sílabas.
d) não tem o amor como tema, ao contrário do que ocorria no Trovadorismo.
e) as figuras de linguagem, características que a torna mais sofisticada do que as cantigas trovadorescas.

02.Chronica de el-rei D. Pedro I
     (...)
A Portugal foram trazidos Álvaro Gonçalves e Pero Coelho, e chegaram a Santarem, onde el-rei, com prazer de sua vinda, porém mal magoado porque Diogo Lopes fugira, os saiu fóra a receber, e, sanha cruel, sem piedade os fez por sua mão metter a tormento, querendo que lhe confessassem quaes foram na morte de Dona Ignes culpados, e que era que seu padre tratava contra elle, quando andavam desavindos por azo da morte d'ella. E nenhum d'elles respondeu a taes perguntas causa que a el-rei prouvesse.
E el-rei, com queixume, dizem que deu um açoute no rosto a Pero Coelho, e elle então contra el-rei em deshonestas e feias palavras, chamando-lhe traídor, à fé perjuro, algoz e carniceiro dos homens. E el-rei, dizendo que lhe trouxessemcebola, vinagre, e azeite para o coelho, enfadou-se d'elles, e mandou-os matar.
A maneira de sua morte, sendo dita pelo muido, seria mui estranha e crua de contar, cá mandou tirar o coração pelos peitos a Pero Coelho, e a Alvaro Gonçalves pelas espaduas. E quaes palavras houve e aquelle que lh'o tirava, que tal officio havia poco em costume, seria bem dorida causa de ouvir. Emfim, mandou-os queimar. E tudo feito ante os paços onde elle pousava, de guisa que comendo olhava quanto mandava fazer.
Muito perdeu el-rei de sua boa fama por tal escambo como este, o qual foi havido, em Portugal e em Castella, por mui grande mal, dizendo todos os bons que o ouviam, que os reis erravam mui muito indo contra suas verdades, pois que estes cavalleiros estavam, sobre segurança, acoutados em seus reinos.
(...)
Fernão Lopes

No trecho acima, Fernão Lopes descreve a morte dos assassinos de Inês de Castro, com quem dom Pedro decidira se casar antes de assumir o trono de Portugal. Inês, que pertencia à poderosa família de Castela, foi morta por ordem do pai de dom Pedro, o rei Afonso IV, temeroso da influência castelhana. Considere as afirmações abaixo:
I.   A crônica de Fernão Lopes reflete o profundo respeito do autor pelos reis, sem esboçar nenhum
     questionamento de suas ações.
II.  O trecho é um bom exemplo da habilidade do autor de descrever o comportamento dos reis
      portugueses, com suas ambições e fraquezas.
III. A finalidade das crônicas de Fernão Lopes é registrar fatos históricos. No entanto, por ser bem
     cuidadoso e criativo, seu texto não é um mero registro burocrático e se aproxima do texto literário.
Estão corretas:
a) I e II.
b) I e III.
c) todas.
d) II e III.
e) apenas II.

FIM  

Trovadorismo - Teoria

     Enquanto Portugal surgia como país, seus poetas exercitavam o Trovadorismo

     O Trovadorismo, primeira manifestação literária portuguesa, desenvolveu-se entre os séculos 12 a 14, marcados pela profunda religiosidade. Os acontecimentos terrenos eram considerados expressões da vontade divina, e a Igreja exercia um verdadeiro monopólio cultural. A arte gótica refletia essa visão de mundo, especialmente na arquitetura: as altas igrejas, com suas torres pontiagudas, projetavam-se em direção aos céus. A época histórica era a Baixa Idade Média, caracterizada pelo rígido sistema feudal, no qual a sociedade se organizava em torno das relações de vassalagem. Também foi a época das lutas da Reconquista, quando as forças cristãs tratavam de retomar o território ocupado pelos árabes.
     Portugal surgiu como Estado independente nesse período, em 1143. A primeira manifestação documentada da literatura portuguesa é a cantiga A Ribeirinha (ou Cantiga de Guarvaia), atribuída a Paio Soares de Taveirós e datada de 1189 ou 1198. Foi escrita em galego-português, língua que predominou na literatura até o século 14 e deu origem ao português e ao galego modernos.

     As cantigas

     O nome Travadorismo veio das trovas ou cantigas, textos poéticos acompanhados de músicas. Memorizadas e transmitidas oralmente, foram muito populares entre os nobres e as pessoas comuns. Os trovadores eram quase sempre da corte, mas também havia os jograis e menestréis, de condição social inferior, que cantavam poesias escritas pelos trovadores para entreter a nobreza. As cantigas foram reunidas em cancioneiros, livros com poemas de vários tipos, alguns preservados até hoje, como a Cancioneiro da Ajuda.
     Há dois grupos de cantigas, as líricas e as satíricas, que também se dividem em tipos:
     a) Líricas:
     *De amor: o homem declara seu amor submisso por uma dama
     *De amigo: a mulher sofre pelo amigo (amante) ausente.
    
     b) Satíricas:
     *De escárnio: sátira indireta que usa ironia e ambiguidade
     *De maldizer: sátira direta, citando o nome da pessoa ironizada.

     Nas cantigas de amor, o poeta reproduz os padrões de vassalagem feudal ao cantar o amor cortês (da corte) submisso à mulher nobre, chamada de "dona" ou "senhor" (que, aqui, significa "senhora"). O falante é um homem, ou seja, o eu-lírico da cantiga de amor é masculino.
     As cantigas satíricas, que podem ser de escárnio ou de maldizer, tratam dos costumes do clero e dos vilões (camponeses livres); da decadência dos nobres, que perdiam espaço para os burgueses em ascensão; e do adultério feminino.

     Forma

     As cantigas medievais, especialmente as de amigo, têm uma estrutura formal apurada. É comum o uso do paralelismo (versos iguais ou ligeiramente variados em mais de uma estrofe) e o refrão ou estribilho. Confira a estrutura de versos A, B, C, D e refrão assinalada na cantiga de Airas Nunes.

     Prosa

     A prosa surgiu em Portugal no século 13 e se desenvolveu durante a transição do feudalismo para o mercantilismo. O conhecimento se disseminava com a criação das primeiras universidades, enquanto permanecia o espírito guerreiro e aventureiro da era da Reconquista. Nesse contexto, foram escritas as novelas de cavalaria, traduzidas de línguas estrangeiras ou adaptadas de relatos sobre supostas façanhas guerreiras na Inglaterra e na França. Uma das mais célebres é A Demanda do Santo Graal, sobre a busca do cálice que guardaria o sangue de Cristo, empreendida pelo rei Artur e por seus cavaleiros da Távola Redonda.

Atividade:

01.Com relação ao Trovadorismo, é correto afirmar que:
a) foi uma manifestação literária limitada à lingua portuguesa.
b) os poemas dos trovadores obedeciam a padrões clássicos.
c) as cantigas de amor refletiam as relações de vassalagem do sistema feudal.
d) define-se principalmente pela prosa escrita na península Ibérica nos séculos 12, 13 e 14.
e) as cantigas de amigo apresentavam o eu-lírico masculino e descreviam a solidariedade entre os combatentes nas guerras da Reconquista.

02.Sobre a poesia trovadoresca em Portugal, é incorreto afirmar que:
a) refletiu o pensamento da época, marcada pelo teocentrismo, o feudalismo e valores altamente moralistas.
b) representou um claro apelo popular à arte, que passou a ser representada por setores mais baixos da sociedade.
c) pode ser dividida em lírica e satírica.
d) em boa parte de sua realização, teve influência provençal.
d) as cantigas de amigo apesar de escritas por trovadores expressam o eu-lírico feminino.

03. En gran coita, senhor,
      que peior que mort'é,
vivo, per bõa fé,
e polo vosso amor
esta coita sofr'eu
por vós, senhor, que eu
vipelo meu gran mal.

D. Dinis

Esses versos pertencem a uma cantiga de ______________ , típica do _________________ português, manisfestação literária da Baixa Idade Média. O eu-lírico no poema é ____________________ .
A alternativa que completa corretamente os espaços na frase anterior é:
a) amigo, Humanismo, feminino
b) maldizer, Trovadorismo, masculino
c) amor, Humanismo, feminino
d) amigo, Trovadorismo, masculino
d) amor, Trovadorismo, masculino

04.Assinale a alternativa incorreta a respeito das cantigas de amor:
a) O ambiente é rural ou familiar.
b) O trovador assume o eu-lírico masculino: é o homem quem fala.
c) Têm origem provençal.
d) Expressam a "coita" amorosa do trovador, por amar uma dama inacessível.
d) A mulher é um ser superior, normalmente pertencente a uma categoria social mais elevada que a do trovador.

05.Ironia, insinuação e ambiguidade indicam cantigas de:
a) amigo.
b) amor e amigo
c) amor.
d) escárnio.
d) maldizer.

06.Entre as características abaixo, assinale a que não se aplica ao Humanismo:
a) consolidação da prosa em língua portuguesa.
b) preocupação com a historiografia.
c) apego aos dogmas da igreja.
d) tempo de descobertas científicas.
e) poesia desvinculada da música.

     FIM

Trovadorismo - Cantigas

     "Por qual dona moir' eu assi"
               Pero D'Armea

Muitos me veen preguntar,
senhor, que lhis diga eu quen
est' a dona que quero ben
e con pavor de vos pesar
nom lhis ouso dizer per nem,
senhor, que vos eu quero ben.
Pero punham de m' apartar,
se poderen de mi saber
por qual dona quer' eu morrer,
e eu, por vos non assanhar,
non lhis ouso dizer per ren,
senhor, que vos eu quero ben.
E, por que me veen chorar
d'amor, queren saber de mi
por qual dona moir' eu assi,
e eu, senhor, por vos negar,
non lhis ouso dizer por mi
per ren que por vós moir' assi.

Pero D'Armea

A   Bailemos nós já todas três, ai
             amigas,
B   so aquestas avelaneiras frolidas,
C   e quem for velida como nós,
              velidas,
refrão       se amigo amar,
D   so aquestas avelaneiras frolidas
refrão      verrá bailar
A'  Bailemos nós fá todas três, ai
            irmanas,
B'  so aqueste ramo destas
            avelanas;
C'  e quen for louçana, como nós,
            louçanas,
refrão   se amigo amar,
D'  so aqueste ramo destas
            avelanas
refrão   verrá bailar.

A''  Por Deus, ai amigas, mentr'al
             non fazemos,
B"   so aqueste ramo frolido
              bailemos;
C"   e quen ben parecer, como nós
              parecemos,
refrão     se amigo amar,
D"   so aquest ramo so'l que nós
              bailemos,
refrão     verrá bailar.

O Canto da Filosofia
Airas Nunes

Foi un dia Lopo jogral
a cas d'un infançon cantar
e mandou-lhe ele por don
dar três couces na garganta,
e fui'lh' escass', a meu cuidar
segundo como el canta.

(...)
Martim Soares

Como Pêro da Arruda
foi da molher ajudado,
non é mui desguisado
pois lh'esta faz tal ajuda,
    de trager, por seu pediolo,
    o filho doutro no colo.

Estevão da Guarda

Glossário
*per ren - por nada
*moir' (eu) - morro (eu)
*so aquestas - sob estas
*frolidas - floridas
*velida - bonita
*verrá - virá
*louçana - charmosa
*mentr'al non fazemos - enquanto não fazemos outra coisa
*Lopo jogral - o jogral Lopo
*a cas - na casa
*infançon - fidalgo inferior
*por don - como presente
*fui-lh' escass' - fou pouco
*a meu cuidar - a meu ver
*da molher - pela (própria) mulher
*desaquisado - estranho
*le'esta faz tal ajuda - ela o ajuda
*pediolo - recompensa

Atividade:
01.Qual o assunto do poema de Pero D'Armea? Com base nessa informação, como você definiria o tipo de cantiga trovadoresca representado?

02.Faça o mesmo exercício para os poemas de Airas Nunes, Matim Soares e Estevão da Guarda.

     FIM