quarta-feira, 31 de agosto de 2011

Modernismo - Geração de 45: João Cabral

     Morte e Vida Severina
     João cabral de Melo

"Somos muitos Severinos
iguais em tudo na vida:
na mesma cabeça grande
que a custo é que se equilibra,
no mesmo ventre crescido
sobre as msmas pernas finas,
e iguais também porque o sangue
que usamos tem pouca tinta.

E se somos Severinos
iguais em tudo na vida,
morremos de morte igual,
mesma morte severina:
que é a morte de que se morre
de velhice antes dos trinta,
de emboscada antes dos vinte,
de fome um pouco por dia
(de fraqueza e de doença
é que a morte severina
ataca em qualquer idade,
e até gente não nascida)."

     O texto acima integra a obra mais conhecida do poeta João Cabral de Melo Neto (1920-1999), o grande nome da poesia modernista da Geração de 45.
     Morte e Vida Severina é um auto, no caso, um auto de Natal, peça de origem medieval e popular. Revela, em sua estrutura, duas características centrais da obra do autor: o rigor formal e o engajamento social. O rigor se estabelece com a métrica, a rima e o ritmo marcados do poema. Cabral será conhecido, também, pelo signo da pedra, da objetividade, de busca da palavra justa, do texto conciso, avesso a sentimentalismo (na imagem, a adaptação para o cinema, de 1977, com direção de Zelito Viana e atuação de José Dumont, Stênio Garcia, Tânia Alves e Elba Ramalho).
     O sentimento de injustiça do mundo, como em Carlos Drummond de Andrade, manifesta-se no poeta pernanbucano na denúncia da vida sofrida do sertanejo pobre. O poeta acompanha a saga de Severino, personagem-símbolo e síntese de toda uma população marginalizada e famélica, no caminho até a cidade.
     Severino encontrará cenas de miséria pelo caminho, mas terminará sua trajetória diante de um nascimento. Como uma ponta de esperança na justiça da vida, soberana.

     Ode ao mestre
     João Cabral de Mello Neto desmitificou a poesia como fruto do "sentimento"
     POR Suzana Paquete

     João Cabral foi o último grande poeta brasileiro deste século. O único que lhe fez sombra foi Carlos Drummond de Andrade. No panorama internacional, sua grandeza é também inegável. Só não foi reconhecido por causa da marginalidade em que vive a língua portuguesa. João Cabral costumava dizer que não tinha biografia, ou que esta se limitava às mudanças de endereço no cargo de diplomata que exerceu em boa parte da vida. Mas é claro que há muito mais em sua história. Há as curiosidades, como um passado de futebolista ou uma enxaqueca que durou cinquenta anos. Ou a vida amorosa, que passou por dois casamentos. Ou as amizades com nomes importantes da arte brasileira e estrangeira, caso do pintor espanhol Joan Miró.
     Talvez se possa dividir seu legado em três partes. Primeiro, ele desmitificou a poesia como fruto da inspiração e do "sentimento". Ele fez versos secos,severamente controlados em seus efeitos. O segundo legado de Cabral está na poesia de cunho social, que reflete sobre o Brasil. A dureza em sua poesia não era apenas questão de gosto. Parecia-lhe a única maneira de retratar o cenário inóspito do Nordeste brasileiro, um de seus temas fundamentais. Há também algo de denúncia nesses textos.
     O terceiro aspecto importante do legado de João Cabral é sua preocupação em fazer uma poesia "participativa", que busca a comunicação com o público. João Cabral (ao lado talvez de Vinícius de Moraes) foi um dos poucos poetas brasileiros a se preocupar com isso. Daí ter aproximado o verso da narrativa. Ou ter recuperado formas populares, em Auto do Frade e, é claro, em Morte e Vida Severina, seu texto mais conhecido, musicado no palco por Chico Buarque de Holanda e utilizado até pela TV.

Atividade:

01.É correto afirmar que no poema Morte e Vida Severina, de João Cabral de Melo Neto,
a) Severino é um exemplo típico de herói moderno.
b) a cena inicial e a final apontam: na volta à terra de origem, o retirante terá a fé que aprendeu com o mestre carpina.
c) o destino que as ciganas preveem para o recém-nascido é o mesmo que Severino já cumprira ao longo de sua vida.
d) o poeta buscou exprimir a vida nordestina no estilo dos autos medievais, valendo-se da retórica que os caracterizavam.
e) o "auto de natal" se define não num sentido religioso, mas como reconhecimento da força renovadora da natureza.

02."Pelo sertão não se tem como não se viver sempre enlutado
Lá o luto não é no vestir
é de nascer com o luto nato"
(João Cabral de Melo Neto)

"Vou me embora pra Pasárgada
Lá sou amigo do Rei
Lá tenho a mulher que quero
na cama que escolherei
Vou-me embora pra Pasárgada"
(Manuel Bandeira)

Quais das afirmações combinam com as passagens acima?
1.O primeiro poema caracteriza-se pelo racionalismo e pelo rigor formal, o que não impede a denúncia social.
2.No segundo poema, a evasão do real se dá em linguagem coloquial, aproximada da prosa.
3.Os autores são pernanbucanos. O primeiro é de Geração de 45, e o segundo, da Primeira fase do Modernismo.
Está(ao) correta(s):
a) 1, 2 e 3.
b) 1 apenas.
c) 2 apenas.
d) 3 apenas.
e) 1 e 2 apenas.

                                                                            FIM

terça-feira, 30 de agosto de 2011

Modernismo - Geração de 45: Clarice Lispector

     Metalinguagem e psicologia
     Com Clarice Lispector, o exame psicológico das personagens é levado ao limite

     Clarice Lispector (1920-1977) é uma das principais renovadoras da linguagem literária brasileira, preocupação essencial de sua geração modernista, de 45. A autora radicaliza a herança do exame psicologico das personagens, característica marcante de abras da geração anterior do Modernismo, como no romance Vidas Secas, de Graciliano Ramos.
     Clarice explorará o recurso do discurso indireto livre, aquele que incorpora a fala da personagem à do narrador, aproximando o leitor dos pensamentos da personagem, e inda introduzirá uma inovação no Brasil.
     O fluxo de consciência, isto é, o registro muitas vezes vertiginoso do pensamento da personagem, sem demarcações claras de passado ou presente, de realidade ou desejo, é marca de toda a produção literária da escritora, desde sua estreia, muito jovem, aos 17 anos, com o romance Perto do Coração Selvagem(1944).
     recurso que consogrou, no exterior, escritores como o irlandês James Joyce, o fluxo de consciência, que remete à escrita automática dos surrealistas, permite o aprofundamento da sondagem psicológica, levando o leitor a um mergulho radical, existencial e intimista na alma das personagens. O instrumento de "entrar" na mente da personagem e reltar automaticamente seu pensamento tem o efeito de produzir rupturas na narrativa, quebras na concepção espaço-tempo.
     Em Clarice, importa menos o laço da tradição literária que o encontro de novos nexos e sentidos, numa outra concepção de narrativa. O  tempo íntimo, particular, tem prevalência sobre o tempo histórico, social.
     Em a Hora da Estrela, romance de 1977, mais uma característica marcante da obra de Clarice se destaca: a metalinguagem, quer dixer, a linguagem que trata da própria linguagem, criticamente, fazendo dela assunto artístico. O narrador se alonga, no início do livro, numa autocrítica radical de sua posição, elevada, em relação à da personagem, a humildade datilógrafa Macabéa, nordestina que migrou para o Rio de Janeiro. De que modo contar essa história? De que perspectiva? Com que tom? Com que tom? Com que palavras?, questiona o narrador.
     A autora também ficou conhecida pela predominância da epifania em suas narrativas. Em termos literais, epifania significa "manifestação religiosa," "aparição divina", mas, em literatura, é momento de fundo êxtase, de descoberta e revelação. A epifania de Clarice é o ponto de virada na vida da personagem, o momento crucial marcado por uma transformação profunda e irrevogável.
     A Clarice cabe ainda outra novidade: é apontada como a inauguradora da voz genuinamente feminina na literatura, exatamente por seu modo de contar e sensibilidade peculiar.

     A Hora da Estrela
     Clarice Lispector

     "(...) Enquanto eu tiver perguntas e não houver resposta continuarei a escrever. Como começar pelo início, se as coisas acontecem antes de acontecer? Se antes da pré-história já havia os monstros apocalípticos? Se esta história não existe, passará a existir. Pensar é um ato. Sentir é um fato. Os dois juntos - sou eu que escrevo o que estou escrevendo. Deus é o mundo. A verdade é sempre um contato interior e inexplicável. A minha vida a mais verdadeira é irreconhecível, extremamente interior e não tem uma só palavra que a signifique. Meu coração se esvaziou de todo desejo e reduz-se ao próprio último ou primeiro pulsar. A dor de dentes que perpassa esta história deu uma fisgada funda em plena boca nossa. Então eu canto alto agudo uma melodia sincopada e estridente - é a minha própria dor, eu que carrego o mundo e há falta de felicidade. Felicidade?
     Nunca vi palavra mais doida, inventada pelas nordestinas que andam por aí aos montes.
     Como eu irei dizer agora, esta história será o resultado de uma visão gradual - há dois anos e meio venho aos poucos descobrindo os porquês. É visão de iminência de. De quê? Quem sabe se mais tarde saberei. Como que estou escrevendo na hora mesma em que sou lido. Só não inicio pelo fim que justificaria o começo - como a morte parece dizer sobre a vida - porque preciso registrar os fatos antecedentes.
                                                                        (...)
     Como é que sei tudo o que vai se seguir e que ainda o desconheço, já que nunca o vivi? É que numa rua do Rio de Janeiro peguei no ar de relance o sentimento de perdição no rosto de uma moça nordestina. Sem falar que eu em menino me criei no Nordeste. Também sei das coisas por estar vivendo. Quem vive sabe, mesmo sem saber que sabe.

Atividade:

01.Identifique a afirmação correta sobre A Hora da Estrela, de Clarice Lispector:
a) A força da temática social, centrada na miséria brasileira, afasta do livro as preocupações com a linguagem.
b) Se o discurso do narrador critica a literatura, as falas de Macabéa exprimem suas críticas às injustiças sociais.
c) O narrador retarda bastante o início da narração da história de Macabéa, vinculando esse adiamento a um autoquestionamento radical.
d) Os sofrimentos da migrante nordestina são realçados pelo contraste entre suas desventuras na cidade e suas lembranças de uma infância pobre, mas vivida no aconchego familiar.

02."Domingo ela acordava mais cedo para ficar mais tempo sem fazer nada. O pior momento de sua vida era nesse dia ao fim da tarde: caía em meditação inquieta, o vazio do seco domingo. Suspirava. Tinha saudade de quando era pequena - farofa seca - e pensava que era feliz. Na verdade por pior a infância é sempre encantada, que susto." (Clarice Lispector, A Hora da Estrela)

Todos os comentários abaixo se referem à produção literária de Clarice Lispector, exceto:
a) A linguagem contém como que uma armadilha: a sua simplicidade enganosa. Nem pela escolha dos vocábulos, nem por sua construção frásica parece ultrapassar um tom de coloquialismo e de narração sem surpresas.
b) É essa existência absurda, ameaçadora e estranha, revelando-se nos indivíduos e a despeito deles, o único fundo permanente de encontro ao qual as personagens se destacam e de onde tiram a densidade humana que as caracteriza.
c) Em sua ficção, o cotidiano é, a partir de certo momento, completamente desagregado.
d) Numa obra literária, para que o jogo da linguagem tenha a propriedade reveladora, é necessário que a linguagem, além de ser instrumento da ficção, seja também, de certo modo, o seu objeto, como de fato ocorre nos textos da autora.
e) O mito poético foi a solução romanesca da autora. Uma obra de tão aguda modernidade que, paradoxalmente, se nutre de velhas tradições, as mesmas que davam à gesta dos cavaleiros feudais a aura do convívio com o sagrado e o demoníaco.

                                                                           FIM

Modernismo - Geração de 45: Guimarães

     A renovação pela linguagem
     A terceira fase do Modernismo é marcada pelo contato com a cultura popular

     A Geração de 45 do Modernismo brasileiro, a da terceira fase do movimento, representa a continuidade dos ideias da primeira e segunda geração, a de 22 e a de 30, mas com uma particularidade: a pesquisa estética obsessiva. A cultura popular, expressão da sabedoria acumulada longe das carteiras da escola, continua, entre os novos modernistas, com seu status irrevogável, com toda a razão.
     É do encontro da cultura formal, de intelectuais generosos, com essa cultura intuitiva  e espontânea que continuariam a nascer grandes marcos da literatura brasileira, como Grande Sertão: Veredas (1956), de João Guimarães Rosa, e Morte e Vida Severina (1955), de João Cabral de Melo Neto, só para citar duas obras-primas da Geração de 45.
     Os novos autores se beneficiam do contexto histórico favorável, marcado, no Brasil, pelo discurso desenvolvimentista do pós-Segunda Guerra Mundial. Diminui, a partir de 1945, a necessidade do escritor de abordar literariamente as questões sociais e políticas do país. A Geração de 45 poderá enfatizar a pesquisa de novas formas de expressão artística.
     O mineiro João Guimarães Rosa (1908-1967) será um dos expoentes do período, juntamente com Clarice Lispecttor (1920-1977) e João Cabral de Melo Neto (1920-1999). Em obras como Sagarana (contos, 1946, sua estreia literária) e Grande Sertão: Veredas (seu único romance), Guimarães Rosa traz a novidade: o modo de falar do sertanejo se consolida na narrativa não só no aproveitamento de seu vocabulário, mas também de sua sintaxe e de seu ponto de vista.
     Em Grande Sertão: Veredas, por exemplo, a história é narrada em primeira pessoa pelo sertanejo Riobaldo, o protagonista, para um interlocutor que nunca se manifesta, a quem chama ora de "senhor" ora de "moço". O conhecimento de  que Rosa acumulava do falar peculiar da gente dos sertões de Minas Gerais, nascido de suas viagens como médico, assegura a verossimilhança desse jagunço-pensador.
     Riobaldo, em sus narrativa memorialista, busca entender o significado de sua vida, do seu amor proibido por Reinaldo, um jagunço do bando, de quem, apenas no final, se saberá Diadorim, uma mulher. Diadorim se fizera passar por homem para entrar no bando e vingar a morte do pai.
     O sertanejo Rosa é um igual. Nos medos, o maior de Riobaldo é do Diabo, com quem teme ter feito um pacto. Essa dualidade de bem e mal percorre a saga sertaneja, sertão adentro. E o leitos vai junto, porque desconfia, com razão, de que o sertão está é aqui, mesmo, dentreo de nós.
     João Guimarães Rosa também entrou para a história de literatura brasileira do século 20 pela renovação vocabular que iniciou. Fez isso ao atualizar termos que já não se usavam mais, muito antigos, e também ao combinar novas palavras a fim de criar outras repletas de significados, numa prática chamada de neologismo.

     Fase do entusiasmo
     A geração do pós-guerra produz sob o estímulo do novo momento mundial

     Em 1945, a Segunda Guerra Mundial, iniciada em 1939, encerra-se, com a queda do nazifascismo. Embora outro período histórico conturbado se inicie, com a polarização de forças entre Estados Unidos e União Soviética, o Brasil engrenará, com entisiasmo.
     Getúlio Vargas deixa a presidência em 1945, após 15 anos no poder, oito de suspensão de direitos mínimos do cidadão, que levou ao encarceramento de opositores e intelectuais independentes, como Graciliano Ramos. É da prisão, aliás, que o escritos escreveria Memórias do Cárcere, que registra acontecimentos do Estado Novo.
     O país entra numa fase de estabilidade, com crescimento acelerado da economia. A euforia encontra o seu auge durante a Presidência de Juscelino Kubitschek (1956-1961) e seu discurso desenvolvimentista. O mote adotado por Juscelino se tornaria célebre: 50 anos em 5. É hora de abrir estradas e colocar para rodar os automóveis produzidos aqui, pela primeira vez. É tempo de levantar o caneco inédito no futebol (o Brasil conquistaria sua primeira Copa do Mundo em 1958, na Suécia), de erguer a nova capital, Brasília (inaugurada em 1960) e de bossa nova, o ritmo que simboliza o novo Brasil.

Atividade:

01."Moço: Toda saudade é uma espécie de velhice".
"Amar é reconhecer-se incompleto."
"Viver é muito perigoso".
(Guimarães Rosa)

As frases acima são de autoria do escritor João Guimarães Rosa. Sobre esse autor, não podemos afirmar que:
a) fez parte da geração de 45, cujo diferencial foi a expansão do regionalismo, um regionalismo universal e cósmico.
b) em suas narrativas, retrata e recria o sertão das Gerais e toda gente que lá vive: matutos, vaqueiros, crianças, velhos, feitiçeiros e loucos. Faz isso sem priorizar questões regionais.
c) como se vê nas frases acima, a sua linguagem incorpora o falar coloquial dos sertanejos, com o uso de aforismos.
d) não conseguiu atingir o objetivo de renovação da linguagem literária, tendo sua obra um caráter passadista e pouco inovador.
e) no conjunto de sua obra, destacam-se Sagarana, seu livro de estreia, Corpo de Baile, Tutameia e um único romance, considerado sua obra-prima, Grande Sertão: Veredas.

02.Leia o trecho abaixo, todos  extraídos do romance Grande Sertão: Veredas, escrito por João Guimarães Rosa e ambientado no Sertão de Minas Gerais.
1. "O que vale, são outras coisas. A lembrança da vida da gente se guarda em trechos diversos, cada um com seu signo e sentimento, uns com os outros acho que nem não misturam."
2. "Nonada. Tiros que o senhor ouviu foram de briga de homem não, Deus esteja. Alvejei mira em árvore, no quintal, no baixo do córrego. (...) Daí, vieram me chamar. Causa dum bezerro branco, erroso, os olhos de nem ser - se viu -; e com máscara de cachorro."
3. "O senhor tolere, isto é o sertão. Uns querem que não seja: [...] Lugar sertão se divulga: é onde os pastos carecem de fechos; onde um pode torar dez, quinze léguas, sem topar com casa de morador; é onde criminoso vive seu cristo-jesus, arredado do arrocho de autoridade."
4. "Eu queria decifrar as coisas qu são importantes. E estou contando não é uma vida de sertanejo, seja se for jagunço, mas a matéria vertente. Queria entender do medo e da coragem, e da gã que empurra a gente para fazer tantos atos, dar corpo ao suceder."
5. "[...] sempre que se começa a ter amor a alguém, no ramerrão, o amor pega e cresce é porque, de certo jeito, a gente quer que isso seja, e vai, na ideia, querendo e ajudando; mas, quando é destino dado, maior que o miúdo, a gente ama inteiriço fatal, carecendo de quer, e é um só facear com as surpresas. Amor desse, cresce primeiro; brota é depois."

Associe adequadamente as seis afirmações formuladas abaixo sobre o romance de João guimarães Rosa com os cinco fragmentos de sua obra que foram transcritos imediatamente acima.
(     ) Sob o forte impacto do seu amor por Diadorim, Riobaldo procura entender a diferença desse amor imposto pelo destino.
(     ) O narrador busca definições exemplares do sertão, espaço que não se pode dimensionar.
(     ) Trata-se das palavras iniciais do romance, que já dão sinais da existência de um interlocutor presente.
(     ) Riobaldo ultrapassa a condição de homem da sua região, narrando o seu desejo de compreender os sentimentos e as forças que movem a vida humana.
(     ) trata-se de uma reflexão sobre a memória dos episódios vividos pelos seres humanos.
(     ) O diabo, que Riobaldo vai enfrentar na cena do pascto, pode assumir várias formas, como as de animais.

Agora aponte a sequência correta de preenchimento dos parênteses, de cima para baixo.
a) 3-2-5-4-1-3.
b) 5-3-2-4-1-2.
c) 4-2-3-1-5-4.
d) 5-3-4-2-2-1.
e) 4-1-3-1-5-2.

                                                                            FIM

segunda-feira, 29 de agosto de 2011

Modernismo - Geração de 45: Guimarães Rosa

Grande Sertão: Veredas
Guimarães Rosa

TEXTO 1
Contar é muito dificultoso. Não pelos anos que já se passaram. Mas pela astúcia que têm certas coisas passadas de fazer balancê, de se remexerem dos lugares. A lembrança da vida da gente se guarda em trechos diversos; uns com outros acho que nem se misturam (...) Contar seguido, alinhavado, só mesmo sendo coisas de rasa importância. Tem horas antigas que ficaram muito mais perto da gente do que outras de recente data. Todas saudade é uma espécie de velhice. Talvez, então, a melhor coisa seria contar a infância não como um filme em que a vida acontece no tempo, uma coisa depois da outra, na ordem certa, sendo essa conexão que lhe dá sentido, meio e fim, mas como um álbum de retratos, cada um completo em si mesmo, cada um contendo o sentido inteiro. Talvez esse seja o jeito de escrever sobre a alma em cuja memória se encontram as coisas eternas, que permanecem...
    
Grande Sertão: Veredas
Guimarães Rosa

TEXTO 2
Eu tinha o medo imediato. E tanta claridade do dia. O arrojo do rio e só aquele estrape*, e o risco d'água, de parte a parte. Alto rio, fechei os olhos. Mas eu tinha até ali agarrado uma esperança. Tinha ouvido dizer que, quando conoa vira, fica boiando, e é bastante a gente se apoiar nela, encostar um dedo que seja, para  se ter tenência, a constância de não afundar, e aí ir seguindo, até sobre se sair no seco. Eu disse isso. E o canoeiro me contradisse: - "Esta é das que afundam inteiras. É canoa de peroba. Canoa de peroba e de pau-de-óleo não sobrenadam..." Me deu tontura. O ódio que eu quis: ah,, tantas canoas no porto, boas canoas boiando, de faveira ou tamboril, de imburana, vinhático ou cedro, e a gente tinha escolhido aquela... Até fosse crime, fabricar dessas, de madeira burra!

                                                                                * instrumento de tortura

História Concisa da Literatura Brasileira
Alfredo Bosi

Diz Alfredo Bosi a respeito de Guimarães Rosas: "'Grande Sertão: Veredas' e as novelas de 'Corpo de Baile' incluem e revitalizam recursos da expressão poética: células rítmicas, aliterações, onomatopeias, rimas internas, ousadias mórficas, elipses, cortes e deslocamentos de sintaxe, vocabulário insólito, arcaico ou de todo neológico, associações raras, metáforas, anáforas, metonímias, fusão de estilos, coralidade."

Atividade:

01.(Texto 1) A) No texto de Guimarães Rosa, como é frequente nos textos do autor, nota-se o emprego de frases de aspecto proverbial. Transcreva uma dessas frases e explique seu sentido. B) Como se pode entender esse recurso, tendo como referência o projeto literário do autor?

02.(Texto 2) De qual dos recursos enumerados Guimarães Rosa faz uso no trecho "Eu disse isso. E o canoeiro me contradisse"? Explique. Codesses recursos pode ser associado a frase "Até fosse crime, fabricar dessas, de madeira burra!"?

03.(Texto 2) Com qual dos recursos mencionados por Alfredo Bosi pode ser associada a frase "Até fosse crime, fabricar dessas, de madeira burra!"?

                                                                          FIM

quarta-feira, 24 de agosto de 2011

Modernismo - Geração de 30: Marco na poesia

     Mestre Drummond
     O maior poeta da segunda geração do Modernismo estreou na literatura em 1930

     Carlos Drummond de Andrade (1902-1987) é festejado como opoeta maior da segunda geração do Modernismo. atribuía a Itabira, Minas Gerais, cidade natal, seu modo de ser no mundo: "Por isso sou triste, orgulhoso: de ferro", confessava no poema Confidência do Itabirano.
     Sua estreia em livro foi com Alguma Poesia, de 1930. É dessa obra inaugural alguns de seus poemas mais conhecidos, como Poema de Sete Faces. No Meio do Caminho e Quadrilha. O livro confirma características modernistas já lançadas pelos modernistas da primeira geração, como o uso extensivo do verso livre, a linguagem e o tema prosaicos, a ironia, o humor. E ainda traz uma novidade: o tema do gauchismo.
     O Poema de Sete Faces, que abre Alguma Poesia, fala do "anjo torto", que anuncia a sina do poeta: "Vai, Carlos! ser gauche na vida". Gauche, em francês, significa esquerda. É como se o poeta fosse condenado a jamais se encaixar no mundo, a viver em dissonância com sua sociedade, numa espécie de exílio em sua própria terra. Esse descompasso entre o eu-lírico e a sociedade será tema de numerosos poe-mas de Drummond.
     Estudiosos da obra do poeta mineiro veem, no poema, o próprio anúncio, nas tais faces, das fases da vida do eu-lírico. Assim, a primeira estrofe corresponderia à infância; a segunda e a terceira, à adolescência; e as demais, à maturidade. No poema No Meio do Caminho, de forma ousada e coloquial, pela repetição de uma mesma estrutura, o poeta concretiza, na pedra, impedimentos de seu tempo. Em Quadrilha, o tema do amor é tratado em seu viés do desencontro, numa visão irônica, sem idealismo.
     Drummond é também reconhecido por seu engajamento social, permeado por certa náusea ao mundo, com o reconhecimento das monstruosidades de que o homem é capaz. A Segunda Grande Guerra (1939-1945), principalmente, será catalisadora da emoção poética do poeta itabirano.
     O terceiro livro de Drummond, Sentimento do Mundo, de 1940, revela esse espanto e a disposição solitária ao semelhante. O poema Mãos Dadas, que integra a obra, é mostra dessa disposição, quando o eu-lírico anuncia que sua matéria é "o tempo presente, os homens presentes": "O presente é tão grande, não nos afastemos / Não nos afastemos muito, vamos de mãos dadas".
     Depois do gauchismo e do engajamento social, o poeta adotará postura mais reflexiva, filosófica e metafísica, de que o livro Claro Enigma, de 1951, é o principal testemunho. É uma poesia eminentemente marcada pelo "não".
     Em Confissão, o poeta sintetiza essa negatividade: "Não amei bastante meu semelhante, / não catei o verme nem curei a sarna (...) Não amei bastante sequer a mim mesmo / contudo próximo. / Não amei ninguém".
     Sua última fase é exatamente a da memória, nos anos de 1970 e 1980, em que "rumina" temas da infância. Os livros Boitempo I e II, de 1987, são a representação desse momento de distensão, marcado pela aproximação do fim da vida. O poeta morreria no mesmo ano de 1987.
   
     Modernismo e misticismo
     Na mesma época, Jorge de Lima e Murilo Mendes mergulhavam fundo na religião

Embora Carlos Drummond de Andrade também tenha investigado temas mais metafísicos, os grandes nomes da metafísica e do misticismo da segunda geração dos modernistas brasileiros são os de outros dois poetas do mesmo período: o alagoano Jorge de Lima (1893-1953) e o mineiro Murilo Mendes (1901-1975).
     Jorge e Murilo vincularam-se a uma produção literária de cunho religioso, que defendia uma arte cristã combativa. Mostra desse ímpeto poético é o livro Tempo e Eternidade, de 1935, coproduzido pelos dois.
     Jorge de Lima é reconhecido ainda por sua poesia social, de que Poemas Negros (1937) é o melhor exemplo. Por outro lado, Murilo Mendes também se vinculou a uma poesia de inspiração surrealista, como expressa na obra Visionário, de 1941.

Atividade:

01.Leia o texto:
No meio do caminho tinha uma pedra
tinha uma pedra no meio do caminho
tinha uma pedra
no meio do caminho tinha uma pedra.

Nunca me esquecerei desse acontecimento
na vida de minhas retinas tão fatigadas.
Nunca me esquecerei qu no meio do caminho
tinha uma pedra
tinha uma pedra no meio do caminho
no meio do caminho tinha uma pedra.
(ANDRADE, Carlos Drummond)

No fragmento acima observamos algumas tendências do Modernismo. Assinale a alternativa que não corresponde às características modernistas evidenciadas no poema:
a) a linguagem coloquial e a rejeição do verso perfeito dos parnasianos.
b) o jogo rítmico, refletindo o estado psicológico do movimento.
c) o tom revolucionário, expressivo da preocupação do poeta com o homem e sua problemática político-social
d) a experimentação linguística expressa no verso intencionalmente repetitivo.
e) a visão dinâmica da vida expressa por uma poética de tendência exclusivamente futurista.

02.MÃOS DADAS
Não serei o poeta de um mundo caduco.
Também não cantarei o mundo futuro.
Estou preso à vida e olho meus companheiros.
Estão taciturnos mas nutrem grandes esperanças.
Entre eles, considero a enorme realidade.
O presente é tão grande, não nos afastemos.
Não nos afastemos muito, vamos de mãos dadas.

Não serei o cantor de uma mulher, de uma história,
não direi os suspiros ao amanhecer, a paisagem vista da
                janela,
não distribuirei entorpecentes ou cartas de suicida,
não fugirei para as ilhas nem serei raptado por serafins.
O tempo é minha matéria, o tempo presente, os homens
                presentes,
a vida presente.
(Carlos Drummond de Andrade, Sentimento do Mundo. 1940)

Considerando o poema "Mãos Dadas", no conjunto da obra a que pertence (Sentimento do Mundo), é correto afirmar que Carlos Drummond de Andrade

a) recusa os princípios formais e temáticos do primeiro Modernismo.
b) tematiza o lugar da poesia num momento histórico caracterizado por graves problemas mundiais.
c) vale-se de temas que valorizam aspectos recalcados da cultura brasileira
d) alinha-se à poética que critica as técnicas do verso livre.
e) relativiza sua adesão à poesia comprometida com os dilemas históricos, pois a arte deve priorizar o tema da união entre os homens.

                                                                       FIM

Modernismo - Geração de 30: Novos Brasis

     Vozes múltiplas
     Depois de uma geração paulista e carioca, o Modernismo se espalha pelo Brasil

     Se, na primeira geração do Modernismo, a que protagoniza a Semana de Arte Moderna de 1922, nota-se a predominância de artistas do eixo São Paulo-Rio, a segunda fase do Modernismo marcará o surgimento de artistas nas mais diversas regiões do Brasil.
     A segunda geração do Modernismo, de 1930 a 1945, revelará, de maneira engajada e crítica, a multiplicidade de faces do próprio Brasil, os Brasis tem, e a existência de problemas que se assemelham em toda parte.
     Na prosa, autores como o alagoano Graciliano Ramos (1892-1953), a cearense Rachel de Queiroz (1910-2003), o paraibano José Lins do Rego (1901-1957), o baiano Jorge Amado (1912-2001) e os gaúchos Érico Veríssimo (1905-1975) e Dyonélio Machado (1895-1985) serão os principais protagonistas do chamado romance de 30. Graciliano, Rachel e Lins do Rego centrarão suas histórias e personagens no sertão nordestino. Retirantes, trabalhadores rurais pobres e a elite rural autoritária ganham complexidade, num tom quase sempre dramático.
     São exemplos dessa perspectiva os romances Vidas Secas (1938) e São Bernardo (1934), de Graciliano Ramos; O Quinze (1930), de Rachel; os romances do ciclo da cana-de-açúcar, centrado nos engenhos nordestinos, como Menino de Engenho (1932) e Fogo Morto (1934), de José Lins do Rego. Jorge Amado combinará engajamento e sensualidade em romances como Cacau (1933), que trata de trabalhadores rurais da região sul baiana; e Capitães da Areia (1936), sobre meninos de rua de Salvador. O gaúcho Érico Veríssimo trabalhará sobre a formação social, econômica e política do Rio Grande do Sul, numa série épica, chamada O Tempo e o Vento, publicada a partir de 1949. Seu conterrâneo Dyonélio Machado, autor do romance Os Ratos (1935), narrerá temas urbanos criticamente, com viés mais psicológico, sobre as sutilezas que acabam por anular o indivíduo.
     A década de 1930 começa com grandes transformações políticas e econômicas. O novo contexto será registrado na obra dos autores. O ciclo da cana-de-açúcar, de José Lins  do Rego, apresenta exatamente o apogeu e a queda do modo de produção dos engenhos tradicionais do Nordeste. Em São Bernardo, de Graciliano Ramos, o choque advém da transformação social do país, com a emancipação crescente da mulher. O fazendeiro Paulo Honório, numa narrativa memorialista, busca entender o porquê de sua história com Madalena, a mulher que tratava como se fora propriedade sua.
     O romance mais popular da segunda geração do Modernismo é Vidas Secas, de Graciliano Ramos, publicado em 1938. Em terceira pessoa, recurso raro no autor, afeito ao discurso em primeira pessoa, o narrador acompanha a saga de uma família de retirantes que foge da seca. Fabiano, sinhá Vitória, o filho mais novo, o filho mais velho e a cadela Baleia são as personagens da narrativa, que combina equilibradamente análise social e psicológica.
     Uma das grandes marcas do romance é o uso extensivo do discurso indireto livre, em que a fala da personagem é incorporada à própria narrativa em  terceira pessoa e forma monólogos interiores. Outro recurso recorrente da obra é o da linguagem antropomórfica e da linguagem zoomórfica. A primeira imprime características humanas a animais. A segunda visa retratar o homem com atributos do animal. Não foi à toa que a cadela Baleia se tornou personagem marcante do romance. Ela é humanizada pela linguagem e pelo discurso indireto livre. Se o animal é humanizado, o homem é animalizado. As personagens do romance são duras, brutas, como reflexo da miséria do meio.

     Tempo de mudanças
     Enquanto os modernistas revolucionavam a literatura, o Brasil se transformava

     * O ano de 1930 marca uma mudança profunda na estrutura de poder com o fim da República Velha.
     * Com o golpe, o gaúcho Getúlio Vargas assume a Presidência e põe fim ao domínio da oligarquia rural paulista e mineira, conhecida como política café com leite.
     * Desde a crise de 1929, com a quebra de valores de Nova York, o café caíra abruptamente de preço, levando o Brasil à profunda crise econômica e enfraquecendo o domínio da oligarquia rural.
     * Revolução de 30 é reflexo da ascensão da burguesia urbana, com o crescimento das cidades. Reflete também o desenvolvimento industrial do país, que será incentivado.
     * Gettúlio fica por 15 anos ininterruptos no poder, até 1945. Volta em 1951 e segue no poder até 1951 e segue no poder até 1954, quando se suicida.

Atividade:

01.Analise as afirmações referentes a Graciliano Ramos:
I. A síntese entre o psicológico e o social característica do escritor só não está presente em Vidas Secas.
II. Em São Bernardo, o protagonista Paulo Honório caracteriza-se pela ambição de dominar não só a terra mas também sua mulher.
III. Em Vidas Secas, o drama de Fabiano e sua família é intensificado pelo monólogo interior.

Para análise das afirmativas, conclui-se que está/estão correta(s) apenas:
a) I.
b) II.
c) III.
d) I e II.
e) II e III.

02.No decênio de 1870, franklin Távora defendeu a tese de que no Brasil havia duas literaturas independentes dentro da mesma língua: uma do Norte e outra do Sul. Por isso, deu aos romances regionais que publicou o título geral de Literatura do Norte. Em nossos dias, um escritos gaúcho, Viana Moog, procurou mostrar com bastante engenho que no Brasil há, em verdade, literaturas setoriais diversas, refletindo as características locais. (Antônio Candido. A Nova Narrativa. São Paulo: Ática, 2003)

Com relação à valorização, no romance regionalista brasileiro, do homem e da paisagem de determinadas regiões nacionais, sabe-se que
a) o romance do Sul do Brasil se caracteriza pela temática essencialmente urbana, colocando em relevo a formação por mei da mescla de características locais e dos aspectos culturais trazidos de fora pela imigração europeia.
b) José de Alencar, representante, sobretudo, do romance urbano, retrata a temática da urbanização das cidades brasileiras e das relações conflituosas entre as raças.
c) o romance do Nordeste caracteriza-se pelo acentuado realismo no uso do vocabulário, pelo temário local, expressando a vida do homem em face da natureza agreste, e assume frequentemente o ponto de vista dos menos favorecidos.
d) a literatura urbana brasileira, da qual um dos expoentes é Machado de Assis, põe em relevo a formação do homem brasileiro, o sincretismo religioso, as raízes africanas e indígenas que caracterizam o nosso povo.
e) Érico Veríssimo, Rachel de Queiroz, Simões Lopes Neto e Jorge Amado são romancistas das décadas de 30 e 40 do século 20, cuja obra retrata a problemática do homem urbano em confronto com a rápido modernização promovida no país pelo Estado Novo.

03.Em sua obra, acentuam os contrastes de requinte e fartura das casas-grandes com a promiscuidade e a miséria das senzalas, a sensualidade desenfreada e a subserviência dos homens do eito. Mas há também o homem e a paisagem. Certamente a observação se concentra na zona açucareira do Nordeste, rica de tradições que datam do século 16, no momento em que se decompõe essa estrutura tradicional por força de uma nova ordem econômica. (Antônio Candido & José Aderaldo Castello. 6ª ed. Rio de Janeiro/São Paulo: Difel, 1977).
A par do contraste entre casa-grande e senzala, comum a todas as regiões dependentes do trabalho escravo, a zona açucareira do Nordeste viveu também o contraste entre
a) os monarquistas escravocratas e os republicanos abolicionistas, tal como se desenvolve em O Quinze.
b) a força do coronelismo conservador e a dos políticos modernos e arrojados, tal como se narra em São Bernardo.
c) a cultura do homem do litoral, mais aberta, e a do homem do sertão, mais conservadora, tal como surge em Menino de Engenho.
d) o mandonismo das grandes fazendeiros e a ação dos grupos de jagunços, tal como se narra em Grande Sertão: Veredas.
e) o modo de produção arcaico do engenho e o mais moderno da usina, tal como se narra em Fogo Morto.

                                                                            FIM 

Modernismo - Geração de 30: Graciliano Ramos

     Vidas Secas
     Graciliano Ramos

     Deu-se aquilo porque sinhá Vitória não conversou um instante com o menino mais velho. Ele nunca tinha ouvido falar em inferno. Estranhando a linguagem de sinhá Terta, pediu informações. Sinhá Vitória, distraída, aludiu vagamente a certo lugar ruim demais, e como o filho exigisse uma descrição, encolheu os ombros.
     O menino foi à sala interrogar o pai, encontrou-o sentado no chão, com as pernas abertas, desenrolando um meio de sola.
     - Bota o pé aqui.
     A ordem se cumpriu e Fabiano tomou medida da alpercata: deu um traço com a ponta da faca atrás do calcanhar, outro adiante do dedo grande. Riscou em seguida a forma do calçado e bateu palmas:
     - Arreda.
     O pequeno afastou-se um pouco, mas ficou por ali rondando e timidamente arriscou a pergunta. Não obteve resposta, voltou à cozinha, foi pendurar-se à saia da mãe.
     - Como é?
     Sinhá Vitória falou em aspectos quentes e fogueiras.
     - A senhora viu?
     Aí Sinhá Vitória se zangou, achou-o insolente e aplicou-lhe um cocorote.
     O menino saiu indignado com a injustiça, atravessou o terreiro, escondeu-se debaixo das catingueiras murchas, à beira da lagoa vazia.
     A cachorra Baleia acompanhou-o naquela hora difícil. Repousava junto à trempe, cochilando no calor, à espera de um osso. Provavelmente não o receberia, mas acreditava nos ossos, e o torpor que a embalava era doce.
                                                                           (...)
     O pequeno sentou-se, acomodou nas pernas a cabeça da cachorra, pôs-se a contar-lhe baixinho uma história. Tinha um vocabulário quase tão minguado como o do papagaio que morrera no tempo da seca. Valia-se, pois, de exclamações e de gestos, e Baleia respondia com o rabo, com a língua, com movimentos fáceis de entender.
     Todos o abandonavam, a cadelinha era o único vivente que lhe mostrava simpatia. Afagou-a com os dedos magros e sujos, e o animal encolheu-se para sentir bem o contato agradável, experimentou uma sensação como a que lhe dava a cinza do borralho.
                                                                           (...)
     Como não sabia falar direito, o menino balbuciava expressões complicadas, repetia as sílabas, imitava os berros dos animais, o barulho do vento, o som dos galhos que rangiam na catinga, roçando-se. Agora tinha tido a ideia de aprender uma palavra, com certeza importante porque figurava na conversa de sinhá Terra. Ia decorá-la e transmiti-la ao irmão e à cachorra. Baleia permanecia indiferente, mas o irmão se admiraria, invejoso.
     - Inferno, inferno

Atividade:

01.O romance Vidas Secas (1938), de Graciliano Ramos, é uma das obras mais conhecidas da segunda fase do Modernismo brasileiro (1930-1945). Trata-se de obra bem-acabada do romance de 30. Apresente características do movimento, baseado na leitura do texto.

02.Vidas Secas costuma apresentar uma inversão: ora gente se assemelha a bicho, num processo de zoomorfização; ora bicho parece gente, num processo de antromorfização. Com base no trecho apresentado, comente esses dois processos.

03.O episódio acima de Vidas Secas descreve a descoberta, pelo filho mais velho, da palavra "Inferno" e de seu significado. O mistério que envolve essa revelação põe em destaque que tipo de religiosidade do sertanejo nordestino?

                                                                           FIM

terça-feira, 23 de agosto de 2011

Modernismo - Geração heroica: Manuel Bandeira

     Humildade e ternura
     Em tempos de escritores performáticos, Manuel Bandeira atuou sem barulho

     Manuel Bandeira é a terceira figura central da primeira geração dos modernistas brasileiros, ao lado dos paulistas Mário e Oswald de Andrade.
     Nascido em 1896, no Recife, mudou-se para o Rio de Janeiro ainda na infância. Embora não tenha participado pessoalmente da Semana de Arte Moderna, realizada em São Paulo no ano de 1922, participou enviando seu poema Os Sapos, uma sátira ácida aos poetas parnasianos, que foi lido por Ronald de Carvalho ao público e gerou muita discórdia entre os presentes.
     Na obra de Bandeira, é possível traçar o panorama da poesia brasileira de toda a primeira metade do século 20. Seus dois primeiros livros de poemas, A Cinza das Horas (1917) e Carnaval (1919), ainda são de inspiração parnasiana e simbolista.
     O Ritmo Dissoluto (1924), se livro seguinte, já prenuncia a revolução modernista de que Libertinagem (1930) será obra bem-acabada. É do livro Libertinagem o poema Poética, espécie de manifesto do Modernismo brasileiro, dessa nova sensibilidade. De forma veemente, o eu-lírico se opõe ao tradicionalismo e à convenção dos temas e da linguagem, ao "lirismo bem comportado", "lirismo funcionário público", e defende o "lirismo dos loucos", o "lirismo dos bêbados", o lirismo que seja libertação.
     A descoberta precoce da tuberculose do poeta se converterá num modo peculiar de olhar o mundo. Bandeira aborda a doença em numerosos poemas, como Pneumotórax, por um viés irônico, uma das característica mais marcantes da nova poesia modernista. Será também reconhecido, até mesmo no estilo, como emblema da humildade, dessa paciência para a vida. A palavra "humildade" vem de "humus", que quer dizer "solo". Um estilo humilde, portanto, muito ligado ao chão.
     A essa perspectiva um tanto quanto estoica, muito paciente, de olhar o mundo, soma-se a ternura. Bandeira será o poeta dos pequenos, dos humildes como ele, acolhidos por sua imensa e generosa compaixão. O poeta saberá perceber o humor genuíno e espontâneo do camelô, da alegria de suas palavras e gestos; compartilhará a "pequenina, ingênua miséria," dos pobres meninos carvoeiros; da mulher que foi bela e hoje já não é mais; da trabalhadora pobre e negra e boa, a boa Irene. São numerosas as personagens recolhidas por Bandeira no cotidiano e transformadas na mais pura ternura poética.
     A infância será outro grande tema do poeta. Festa de São João, brincadeira na rua, porquinho-da-índia, evocações do Recife aparecerão, aqui e ali, como elementos centrais da poesia, numa linguagem que também se aproxima do universo infantil. Manuel Bandeira, contrariando suas previsões desde muito cedo, só viria a morrer aos 82 anos, no Rio de Janeiro.

     Poeta múltiplo
     Entre os portugueses, Fernando Pessoa dominava o cenário com suas personas

     Em Portugal, a primeira geração do Modernismo surge em 1915 e leva o nome de orfeísmo, porque se consolida em torno da revista Orpheu. Participaram da revista os primeiros modernistas, como Mário de Sá-Carneiro e Fernando Pessoa.
     Este último se multiplica em dezenas de personalidades literárias, chamadas de heterônimos. Três ganham destaque: Álvaro de Campos, Alberto Caeiro e Ricardo Reis.
     É do primeiro o trecho do poema abaixo, chamado Ode Triunfal, de 1914:

"Ah, poder exprimir-me todo como um motor se exprime!
Ser completo como uma máquina!
Poder ir na vida triunfante como um automóvel último-modelo!
Poder ao menos penetrar-me fisicamente de tudo isto,
Rasgar-me todo, abrir-me completamente, tornar-me passento
A todos os perfumes de óleoas e calores e carvões
desta flora estupenda, negra, artificial e insaciável!
Fraternidade com todas as dinâmicas!
Promíscua fúria de ser parte-agente
Do rodar  férreo e cosmopolita
Dos comboios estrênuos,
Da faina transportadora-de-cargas dos navios,
Do giro lúbrico e lento dos guindastes,
Do tumulto disciplinado das fábricas,
E do quase-silêncio ciciante e monótono das correias de
transmissão!"

Estrela da Vida Inteira
Manuel Bandeira

Estou farto do lirismo comedido
Do lirismo bem comportado
Do lirismo funcionário público com livro de ponto
expediente protocolo e manifestações de apreço ao sr.
diretor.

Estou farto do lirismo que para e vai averiguar
no dicionário o cunho vernáculo de um vocábulo.

Abaixo os puristas
Todas as palavras sobretudo os barbarismos
universais
Todas as construções sobretudo as sintaxes de
exceção
Todos os ritmos sobretudo os inumeráveis

Estou farto do lirismo namorador
Político
Raquítico
Sifilítico
Do todo lirismo que capitula ao que quer que seja
fora de si mesmo

De resto não é lirismo
Será contabilidade tabela de co-senos secretário do
amante exemplar com cem modelos da cartas e as
diferentes maneiras de agradar às mulheres, etc.

Quero antes o lirismo dos loucos
O lirismo dos bêbados
O lirismo difícil e pungente dos bêbados
O lirismo dos clowns de Shakespeare
- Não quero mais saber do lirismo que não é
libertação.

Atividade:

01.Considere o poema Poética, de Manuel Bandeira. Há nele uma oposição entre:
a) As concepções da poesia da poesia modernista, abertas à livre expressão e à ousadia, e as estéticas do passado, presas a regras formais e sentimentalismo ornamental.
b) O lirismo defendido pela voz poética do texto e a concepção de poesia abraçada por Shakespeare, autor citado de modo crítico no poema.
c) O desejo de liberdade e evasão e a repressão política do tempo em que o texto foi composto.
d) As atitudes dos funcionários públicos, metódicos por dever, e às dos poetas, loucos em essência.
e) A poesia engajada (assumida pelo poeta) e a poesia da "arte pela arte"  dos parnasianos.

02.Leia os poemas abaixo e assinale a opção incorreta.
Eu faço versos como quemchora
De desalento... de desencanto...
Fecha o meu livro, se por agora
Não tens motivo nenhum de pranto.

Meu verso é sangue. Volúpia ardente...
Tristeza esparsa... remorso vão...
Dói-me nas veias. Amargo e quente,
Cai, gota a gota, do coração.

E nestes versos de angústia rouca
Assim dos lábios a vida corre,
Deixando um acre sabor na boca.

Eu faço versos como quem morre."
(Desencanto, Manuel Bandeira)

"Febre, hemoptise, dispneia e suores noturnos.
A vida inteira que podia ter sido e que não foi.
Tosse, tosse, tosse.

Mandou chamar o médico:
- Diga trinta e três.
- Trinta e três... trinta e três... trinta e três...
- Respire.
........................................................................
- O senhor tem uma escovação no pulmão esquerdo e o
pulmão direito infiltrado.
- Então, doutor, não é possível tentar o pneumotórax?
- Não. A única coisa a fezer é tocar um tango argentino.
(Pneumotórax, Manuel Bandeira)

a) Pneumotórax contrasta com a cadência tradicional dos versos rimados e metrificados de Desencanto.
b) Pneumotórax apresenta, em um estilo irônico, a questão da morte, tema que permeia grande parte da poesia de Bandeira.
c) desencanto, poema escrito em um estilo impregnado de ressonâncias parnasianosimbolistas, destoa do estilo modernista de Pneumotórax.
d) Desencanto é um metapoema marcado por humor e ironia, o maior traço estilístico da lírica modernista brasileira.

                                                                           FIM
    
    

Modernismo - Mário e Oswald

     Nova sensibilidade
     A literatura acompanhou as rápidas mudanças do começo do século 20

     A partir do início do século 20, uma série de transformações profundas vai chacoalhar as estruturas da antiga ordem moral, social e econômica do mundo. O epicentro da mudança é a Europa. Nascia uma nova visão de mundo, que a arte reverberou intensamente.
     A fábrica prometia prosperidade. O automóvel acelerava a vida. As máquinas, de modo geral, assegurariam mais conforto e felicidade. O futuro havia chegado. Era tempo de se livrar de tudo aquilo que tivesse o gosto azedo de passado. As vanguardas artísticas europeias, como o Cubismo, o Dadaísmo e o surrealismo, chegam em busca do novo, do genuíno, de novas abordagens e linguagens, inaugurando uma fase criativamente efervescente, baseada no princípio da experimentação. Abaixo tudo que fosse para tolher a genuína criatividade, acima tudo que libertasse e celebrasse os novos tempos.
     No Brasil, nas primeiras décadas do século 20, as coisas também já mudavam de figura: as cidades ganhavam importância. A burguesia nascente brasileira se fortalecia. As vanguardas modernistas, portanto, encontram um contexto também propício, por aqui. Os escritores Mário de Andrade e Oswald de Andrade se convertem nos principais incentivadores da busca de uma arte brasileira renovada, que assimilasse as mudanças propostas no exterior, mas tivesse forma e conteúdo próprios, conectados com nossas raízes.
     Na Semana de Arte Moderna de 22, realizada no Theatro Municipal de São Paulo, nos dias 13, 15 e 17 de fevereiro, é o grande marco dessa nova visão e sensibilidade. Mas, afinal, o que queriam esses tais modernistas? Boa parte do público que foi conhecê-los, na Semana de 1922, não gostou nada do que viu.
     Os modernistas defendiam alguns pressupostos para a arte e para a vida. Na literatura, adotaram uma linguagem muito mais coloquial; praticaram o verso livre; elegeram novos temas poéticos, bem prosaicos, do dia a dia; valorizaram e trouxeram a cultura popular para dentro da arte tradicional, refundindo tudo; inauguraram, assim, um novo lirismo.
     O nacionalismo também foi importante para os modernistas. Recuperaram, por exemplo, a linha indianista iniciada com o Romantismo, mas dela subtraem toda idealização. Querem uma volta radical a certas raízes, de que a Antropofagia de Oswald de Andrade foi o melhor exemplo. Absorver o que vem de fora, sim, mas, em seguida, misturá-la com nossas raízes e digeri-la bem, resultando uma arte nacional, a exemplo do que fizeram os índios com o bispo Sardinha - fato transformador em alegoria por Oswald, no Manifesto Antropófago, de 1928.
     Mário de Andrade também abordou o conceito de nacionalismo em sua obra mais famosa, Macunaíma, o Herói sem Nenhum Caráter. Lançado em 1928, o livro apresenta uma variedade de estilos, combinando vocábulos indígenas, africanos, gírias, ditos populares e até a linguagem empolada e complexa dos primórdios do Brasil, como no capítulo da "Carta às Icamiabas." A nacionalidade, aqui, é tratada às avessas. O herói Macunaíma seria a reunião dos defeitos (e de qualidades) do brasileiro; a personagem entrou para a cultura popular por seu bordão: "Ai que preguiça!".

     Canibalismo cultural
     A literatura de Oswald de Andrade se inspirou no caso do bispo devorado por índios

O bispo Sardinha, o religioso português que, dizem, foi devorado pelos índios Caeté, em 1556, se transformou num símbolo da antropofagia cultural defendida por Oswald de Andrade. O ano da morte do religioso seria o primeiro da era antropofágica brasileira, símbolo da digestão das ideias estrangeiras e sua transformação em cultura nacional.
     Leia agora trecho do Manifesto Antropófago, de 1928.
     "Só a Antropofagia nos une. Socialmente. Economicamente. Filosoficamente.
     Única lei do mundo. Expressão mascarada de todos os individualismos, de todos os coletivismos. De todas as religiões. De todos os tratados de paz.
     Tupi, or not tupi that is the question.
     Contra todas as catequeses. E contra a mãe dos Gracos.
     Só me interessa o que não é meu. Lei do homem. Lei do antropófago. (...)
     Queremos a Revolução Caraíba. Maior que a Revolução Francesa. A unificação de todas as revoltas eficazes na direção do homem. Sem nós a Europa não teria sequer a sua  pobre declaração dos direitos do homem. (...) (Oswald de Andrade em Piratininga)

Atividade:

01.A presença da temática indígena em Macunaíma, de Mário de Andrade, tanto participa__________ , quanto  representa uma retomada, com novos sentidos, __________.
Mantinha a sequência, os trechos pontilhados serão preenchidos corretamente por
a) do movimento modernista da Antropofagia / do Regionalismo da década de 30.
b) do interesse modernista pela arte primitiva / do indianismo romântico.
c) do movimento modernista da Antropofagia / do Condoreirismo romântico.
d) da vanguarda estética do Naturalismo / do indianismo romântico.
e) do interesse modernista pela arte primitiva / do Regionalismo da década de 30.

02.O Modernismo brasileiro eclodiu com a Semana de Arte Moderna, em 1922. Sobre o movimento, somente podemos afirmar que:
a) os artistas brasileiros queriam formalizar uma grande manifestação para consagrar os ideais clássicos, expressos através do Parnasianismo.
b) a intelectualidade brasileira, de fato, já estava tomando rumos diversos daqueles presentes no século 19, porém a tendência da poesia era a de permanecer melancólica e saudisista.
c) seria um acontecimento de cunho eminentemente nacionalista, sem nenhuma ligação com tendências ou movimentos que não fossem integralmente gerados no Brasil.
d) a Semana ratificaria as premissas do direito à pesquisa estética, disseminada em tantas expressões (literatura, música, pintura, escultura) quantas fossem as dos participantes do movimento.
e) teria como figuras de proa os nomes de Victor Brecheret, Anita Malfatti, Oswald de Andrade e Rui Barbosa.

02.BONDE
O transatlântico mesclado
Dlendiena e esguicha luz
Postretutas e famias sacolejam
(Oswald de Andrade)

Considere as seguintes afirmações:
I. O texto apresenta linguagem concisa e aproveita, poeticamente, variantes linguísticas populares.
II.O texto utiliza a chamada "linguagem cinematográfica" dos modernistas a serviço da criação de cena cotidiana.
III.O uso de neologismo e a regularidade métrica do texto exemplificam tendência estética do início do século 20.
IV.O experimentalismo preconizado pelos poetas da Semana de 22 revela-se, por exemplo, no uso das palavras "postretutas" e "famias", que concretizam, foneticamente, a ideia do "sacolejo".

Assinale:
a) se todas estiverem corretas.
b) se todas estiverem incorretas.
c) se apenas I e II estiverem corretas.
d) se apenas I, II e III estiverem corretas.
e) se apenas I, II e IV estiverem corretas.

03.ERRO DE PORTUGUÊS
Quando o portugês chegou
Debaixo de uma bruta chuva
Vestiu o índio
Que pena!
Fosse uma manhã de Sol
O índio tinha despido
O português.
(Oswald de Andrade. Poesias Reunidas. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 1978.)

O primitivismo observável no poema transcrito acima, de Oswald de Andrade, caracteriza de forma marcante.
a) o regionalismo do Nordeste.
b) o concretismo paulista.
c) a poesia Pau-Brasil.
d) o simbolismo pré-modernista.
e) o tropicalismo baiano.

                                                                    FIM
    

segunda-feira, 22 de agosto de 2011

Modernismo - Geração heroica

     Macunaína
     Mário de Andrade

I
MACUNAÍMA
     No fundo do mato-virgem nasceu Macunaíma, herói de nossa gente. Era preto retinto e filho do medo da noite. Houve um momento em que o silêncio foi tão grande escutando o murmurejo do Uraricoera, que a índia tapanhumas pariu uma criança feia. essa criança é que chamaram de Macunaíma.
     Já na meninice fez coisas de sarapantar. De primeiro passou mais de seis anos não falando. Si o incitavam a falar exclamava:
     - Ai! que preguiça!...
     e não dizia mais nada. Ficava no canto da maloca, trepado no jirau de paxiúba, espiando o trabalho dos outros (...). Vivia deitado mas si punha os olhos em dinheiro, Macunaíma dandava pra genhar vintém. E também espertava quando a família ia tomar banho no rio, todos juntos e nus. Passava o tempo do banho dando mergulho, e as mulheres soltavam gritos gozados por causa dos guaianuns diz-que habitando a água-doce por lá.
                                                                             (...)

IX
CARTAS PRAS ICAMIABAS
Às mui queridas súbditas nossas, Senhoras Amazonas. Trinta de Maio de Mil Novecentos e Vinte e Seis, São Paulo.
Senhoras:
     Não pouco vos surpreenderá, por certo, o endereço e a literatura desta missiva. Cumpre-nos, entretanto, iniciar estas linhas de saudade e muito amor, com desagradável nova. É bem verdade que na boa cidade de São Paulo - a maior do universo, no dizer de seus prolixos habitantes - não sois conhecidas por "icamiabas", voz espúria, sinão que pelo, apelativo de Amazonas; e de vós, se afirma, cavalgardes ginetes belígeros e virdes da Hélade clássica; e assim sois chamadas. Muitos nos pesou a nós, Imperator vosso, tais dislates da erudição, porém heis de convir conosco que, assim, ficais mais heroicas e mais conspícuas, tocadas por essa platina respeitável da tradição e da pureza antiga.
                                                                           (...)
     Porém, senhoras minhas! (...) Em breve seremos novamente uma colônia da Inglaterra ou da América do Norte!... Por isso e para eterna lembrança destes paulistas, que são a única gente útil do país, e por isso chamados de locomotivas, nos demos ao trabalho de metrificarmos um dístico, em que se encerram os segredos de tanta desgraça:
     "POUCA SAÚDE E MUITA SAÚVA, OS MALES DO BRASIL SÃO."
                                                                           (...)
     Ci guarde a Vossas Excias.

     Macunaíma, Imperator.

Atividade:

01.O livro Macunaíma é qualificado como rapsódia, que é, em música, um tipo de composição que utiliza variedade de motivos populares. Justifique a afirmação.

02.Traços marcantes do Modernismo foram o humor e o coloquialismo. Com base nos trechos do livro de Mário de Andrade destacados acima, confirme esses características.

03.O Modernismo defendia um nacionalismo diferente do advogado pelo Romantismo. Com base no texto, como se caracteriza o nacionalismo dos modernistas?

                                                                        FIM
    

domingo, 21 de agosto de 2011

Pré-Modernismo - Nacionalismo ingênuo

     Coragem e ironia    
     Lima Barreto não aceitou a condição que a sociedade lhe reservava

     Afonso Henriques de Lima Barreto era mulato, num país recém-saído da escravidão. A vida toda lutou contra o preconceito. Jamais se curvou diante dos poderosos da época e retratou-os todos com larga ironia.
     Sua obra mais festejada é Triste Fim de Policarpo Quaresma, publicada, inicialmente, no Jornal do Comércio, do Rio, como romance de folhetim, em 1911. Cinco anos mais tarde, em 1916, viraria livro. Mas Lima Barreto é autor de muitas outras obras, além de escrever regularmente, como articulista, para a imprensa carioca, no decorrer das primeiras duas décadas do século 20.
     Por exemplo, escreveu os romances Clara dos Anjos, Recordações do Escrivão Isaías Caminha e Morte de M.J. Gonzaga de Sá, além de contos que ganharam notoriedade, como O Homem que Sabia Javanês e Dentes Negros, Cabelos Azuis.
     Nesse último, aliás, Lima Barreto faz análise aguda de sua posição na sociedade, alegoria da posição do homem independente no mundo. Na imagem de Lima, pelas palavras de Gabriel, a personagem que tem mesmo dentes negros e cabelos azuis, o homem independente viveria numa corda bamba, equilibrando-se. Era o próprio Lima equilibrista, que não podia aceitar o carreirismo de seus pares, o individualismo de suas ações, a vacuidade de suas propostas, mas precisava viver.
     Policarpo Quaresma, o protagonista de sua obra mais famosa, é um árduo nacionalista. Sonha com uma nação que de fato integre, numa nova civilização, todos os seus costumes e gentes, igualmente, sem distinção. Esse projeto de brasilidade, de formação da identidade nacional, inclui o exame das personalidades do Brasil, o reconhecimento, a valorização e a incorporação por todos de seus traços distintivos, como a modinha e o tupi-guarani.
     Policarpo é o Dom Quixote brasileiro. A visão apaixonada do Brasil impede que enxergue, como a personagem de Miguel de Cervantes, as grandes mazelas da nação. Há um descompasso entre o que acredita que seja e o que de fato é. Será do choque dessa visão ingênua e, a seguir, de sua ação também ingênua, em nome de representantes da pátria, que decorrerá seu fim. "A sua vida era uma decepção, uma série, melhor, um encadeamente de decepções. A pátria que quisera ter era um mito; um fantasma criado por ele no silêncio do seu gabinete", reconhece Policarpo, no fim do livro, preso e condenado à morte por quem defendera e lutara.

     Ciência e política
     Conheça as principais características das obras escritas no Pré-Modernismo

     * Nacionalismo - defesa de um país que incluísse os brasileiros, indistintamente; valorização de atributos nacionais.
     * Independência - liberdade de pensamento e abordagem da realidade brasileira. Postura avessa a preconceitos.
     * Análise científica - infliência das ciências sociais e naturais na construção literária e na análise da sociedade.
     * Crítica social - eleições de novos temas, personagens e de gente que até então aparecera pouco na literatura brasileira até aquele momento: os pobres, de modo geral.
     * Antiacademicismo - emprego de uma linguagem coloquial, simples e direta.

     Dom Quixote brasileiro
     Lima Barreto

     "Policarpo era patriota. Desde moço, aí pelos vinte anos, o amor da Pátria tomou-o todo inteiro. Não fora o amor comum, palrador e vazio; fora um sentimento sério, grave e absorvente. Nada de ambições políticas ou administrativas; o que Quaresma pensou, ou melhor: o que o patriotismo o fez pensar, foi num conhecimento inteiro do Brasil, levando-o a meditações sobre os seus recursos, para depois antão apontar os remédios, as medidas progressivas, com pleno conhecimento de causa.
     Não se sabia bem onde nascera, mas não fora decerto em São Paulo, nem no Rio Grande do Sul, nem no Pará. Errava quem quisesse encontrar nele qualquer regionalismo; Quaresma era antes de tudo brasileiro. Não tinha predileção por esta ou aquela parte de seu país, tanto assim que aquilo que o fazia vibrar de paixão não eram só os pampas do Sul com o seu gado, não era o café de São Paulo, não eram o ouro e os diamantes de Minas, não era a beleza da Guanabara, não era a altura da Paulo Afonso, não era o astro de Gonçalves /dias ou o ímpeto de Andrade Neves - era tudo isso junto, fundido, reunido, sob a bandeira estrelada do Cruzeiro.
     Logo aos dezoito anos quis fazer-se militar; mas a junta de saúde julgou-o incapaz. Desgastou-se, sofreu, mas não maldisse a Pátria. O ministério era liberal, ele se fez conservador e continuou mais do nunca a amar a "terra que o viu nascer". Impossibilitado de evoluir-se sob os dourados do exército, procurou a administração e dos seus ramos escolheu o militar.
     Era onde estava bem. No meio de soldados, de canhões, de veteranos, de papelada inçada de quilos de pólvora, de nomes de fuzis e termos técnicos de artilharia, aspirava diariamente aquele hálito de guerra, de bravura, de vitória, de triunfo, que é bem o hálito da Pátria."

Atividade:

01."Que lhe importavam os rios? Eram grandes? Pois que fossem... Em que lhe contribuiria para a felicidade saber o nome dos heróis do Brasil? Em nada... O importante é que ele tivesse sido feliz. Foi? Não. Lembrou-se das suas coisas de tupi, do "folk-lore", das suas tentativas agrícolas... Restava disso tudo em sua alma uma satisfação? Nenhuma! Nenhuma!
     O tupi encontrou a incredulidade geral, o riso, a mofa, o escárnio; e levou-o à loucura. Uma decepção. E a agricultura? Nada. As terras não eram ferazes e ela não era fácil como diziam os livros. Outra decepção. E, quando o seu patriotismo se fizera combatente, o que achara? Decepções. Onde estava a doçura de nossa gente? Pois ele não a viu combater como feras? Pois não o via matar prisioneiros, inúmeros? Outra decepção. A sua vida era uma decepção, uma série, melhor, um encadeamento de decepções."

Entre as afirmações abaixo, e com base no trecho da obra de Lima Barreto, aponte a afirmativa correta.
a) O trecho mostra que, em todos os momentos de sua vida, Quaresma preocupou-se com o bem coletivo. Mas, neste momento, ele pensa em si próprio e vê que é um homem abandonado, incompreendido, injustiçado. Toda a sua dedicação à pátria não lhe deu felicidade nenhuma: é um homem só e decepcionado.
b) O trecho foi extraído do 1º capítulo do romance em questão, que introduz o major Quaresma em seu sítio, fazendo uma reflexão de sua vida passada. A partir daí, em tempo psicológico, a narrativa resgata os episódios marcantes da vida de Quaresma envolvido na consolidação de seus projetos nacionalistas.
c) Este trecho mostra que, em todos os momentos de sua vida, Quaresma agiu como um cidadão nacionalista, envolvido, sobretudo, com o bem da pátria. Em sua reflexão fica claro que, mesmo após sua vida ter sido "um encadeamento de decepções", ele, o indivíduo, não se importa.
d) Nas últimas linhas do trecho acima há a afirmação de que "A sua vida era uma decepção, uma série, melhor, um encadeamento de decepções". A última grande decepção de Quaresma, dentro de seu projeto de mostrar que o Brasil era uma nação viável e grandiosa, foi descobrir que o rio Amazonas era menor que o rio Nilo.

                                                                  FIM

    

sábado, 20 de agosto de 2011

Pré-Modernismo - Análise social

     Nova visão do Brasil     
     Os pré-modernistas não se limitaram a abrir caminho para o Modernismo

     Autores como Euclides da Cunha, Lima Barreto e Monteiro Lobato são donos de obras fundamentais para a cultura brasileira. Foram os semeadores de uma nova visão sobre o Brasil e sua gente, defensores de uma brasilidade genuína e generosa, feita da junção de todos os brasileiros, rompendo com uma larga tradição cultural e social de exclusão e preconceito.
     Com o período literário chamado de Pré-Modernismo, que vigorou nas duas primeiras décadas do século 20, a literatura se afastava de sua face beletrista e elitista, diversão de salão, para se transformar em instrumento de reflexão e análise da sociedade brasileira. O sertanejo retratado por Euclides da Cunha (1866-1909) em Oa Sertões contraria todas as teses raciais em vigor no fim do século 19. No livro, o autor relata a história da Guerra de Canudos e reconhece no sertanejo não um inimigo do avanço, representado pela república, mas uma vítima do atraso do Brasil.
     Com Lima Barreto (1881-1922), nasce outra perspectiva da população do Rio de Janeiro no começo do século 20, quando a cidade era a capital federal. O interesse do autor se voltava para as narrativas da população marginalizada, que vivia nos distantes subúrbios. Suas personagens são os anOnimos do Rio de Janeiro. E Monteiro Lobato (1882-1948) revela, com base na observação direta das cidades do Vale do Paraíba, as mazelas do interior do Brasil, sintetizadas na figura do personagem Jeca Tatu.
     A influência das ciências sociais e naturais também foi característica do movimento pré-modernista, assim como a independência de pensamento. Euclides foi a Canudos como repórtes do jornal O Estado de S. Paulo para, em princípio, confirmar a vitória da civilizaçao sobre a barbárie e as teses da superioridade de raça. Entretanto, foi capaz de abrir mão de convicções arraigadas e se voltar contra o Exército e o governo. O pensamento autônimo também caracterizou a obra e a vida de Monteiro Lobato e de Lima Barreto. O primeiro foi um dos precursores das campanhas nacionalistas em defesa da autonomia brasileira. O segundo revelou o carreirismo e a hipocrisia da sociedade de sua época.
     Por fim, Augusto dos Anjos (1884-1914) foi o grande nome da poesia pré-modernista, ao combinar lirismo com cientificismo. Dessa combinação é feita sua única obra, Eu, de 1912. O poema Versos Íntimos revela bem sua disposição: "(...) Toma um fósforo. Acende teu cigarro! / O beijo, amigo, é a véspera do escarro. / A mão que afaga é a mesma que apedreja".

     Defensores da nação

     Euclides a Cunha
     * Nascimento-morte: 1866-1909
     * Formação: Engenheiro
     * Grande tema: A Guerra de Canudos
     * Grandes personagens: O sertanejo
     * Grande obra: Os Sertões
     * Estilo: Grandiloquente e angustiado
     * Frase: "O sertanejo é, antes de tudo, um forte"
     Lima Barreto
     * Nascimento-morte: 1881-1922
     * Formação: Curso de engenharia incompleto
     * Grande tema: Subúrbios do Rio
     * Grandes personagens: Pequenos burocratas
     * Grande obra: Triste Fim de Policarpo Quaresma
     * Estilo: Coloquial e irônico
     * Frase: "A pátria que quisera ter era um mito"

Atividade:

01."(...) esta aparência de cansaço ilude. Nada é mais surpreendedor do que vê-la desaparecer de improviso. Naquela organização combalida operam-se, em segundos, transmutações completas. Basta o aparecimento de qualquer incidente (...). O homem transfigura-se".
Assinale a frase que, retirada de Os Sertões, sintetiza o trecho citado.
a) "é o homem permanentemente fatigado."
b) "o sertanejo é, antes de tudo, um forte".
c) "a raça forte não destrói a fraca pelas armas, esmaga-a pela civilização".
d) "reflete a preguiça invencível (...) em tudo".
e) "a sua religião é como ele - mestiça".

02."Foi nestas condições desfavoráveis que partiram a 12 de janeiro de 1897. Tomaram pela Estrada de Cambaio. É a mais curta e a mais acidentada. Ilude a princípio, (...) numa cinta de terrenos férteis sombreados de cerradõesque prefiguram verdadeiras matas. Transcorridos alguns quilômetros, (...) perturba-se em trilhas pedregosas (...). Tinha meio caminho andado. As estradas pioravam crivadas de veredas, serpeando em morros, alçando-se em rampas... (...) Entretanto era imprescindível a máxima celeridade."
Todas as afirmativas estão associadas ao trecho selecionado de Os Sertões, eceto:
a) Atenção e rapidez são necessárias aos envolvidos em uma experiência belicosa.
b) A presença do inimigo é percebida pelos tastros de sua passagem ainda recente.
c) Os obstáculos que se apresentam prenunciam os trágicos eventos que ocorreram.
d) É possível inferir que se trata de um episódio constante na segunda parte da obra.
e) A estrada referida perturba a avaliação inicial do viajante dada a riqueza natural da área.


03.Assinale a alternativa incorreta sobre Euclide de Cunha.
a) Em Os Sertões, o autor se utiliza de uma linguagem preciosista, em que pontificam os termos emprestados à ciência da época.
b)  Os Sertões é o produto final de um longo trabalho de pesquisa bibliográfica e de uma engajada cobertura jornalística realizada "in loco".
c) A utilização de personagens ficcionais lado a lado com figuras históricas permite ao autor inserir impressões pessoais sobre o episódio.
d) Nas duas primeiras partes de Os Sertões, o autor se mostra adepto das doutrinas científicas da época, que se estabeleciam relação direta entre herança biológica e progresso dos povos.
e) Na última parte de Os Sertões, "A Luta", opera-se uma transformação do ponto de vista do autor, que contagia o leitos: inicialmente vistos como fanáticos, os sertanejos de Canudos conquistam o respeito e a admiração.

05.Assinale a alternativa incorreta sobre o Pré-Modernismo.
a) Não se caracterizou como uma escola literária com princípios estéticos bem delimitados, mas como um período de prefiguração das inovações temáticas e linguísticas do Modernismo.
b) Algumas correntes de vanguarda do início do século 20, como o Futurismo e o Cubismo, exerceram grande influência sobre nossos escritores prè-modernistas, sobretudo na poesia.
c) Tanto Lima Barreto quanto Monteiro Lobato são nomes significativos da literatura pré-modernista produzida nos primeiros anos do século 20, pois problematizam a realidade cultural e social do Brasil.
d) Euclides da Cunha, com a obra Os Sertões, ultrapassa o relato meramente documental da batalha de Canudos para fixar-se em problemas humanos e revelar a face trágica da nação brasileira.
e) Nos romances de Lima Barreto observa-se, além da crítica social, a crítica ao academicismo e à linguagem empolada e vazia dos parnasianos, traço que revela a postura moderno do escritos.

                                                                  FIM  

Pré-Modernismo

     Os Sertões
     Euclides da Cunha

     "Canudos não se rendeu"

     VI
     (...) Fechemos este livro.
     Canudos não se rendeu. Exemplo único em toda a história, resistiu até ao esgotamento completo. Expugnado palmo a palmo, na precisão integram do termo, caiu no dia 5, ao entardecer, quando caíram seus últimos defensores, que todos morreram. Eram quatro apenas: um velho, dois homens feitos e uma criança, na frente dos quais rugiam raivosamente cinco mil soldados.
     Forremo-nos à tarefa de descrever os seus últimos momentos. Nem poderíamos fazê-lo. (...)
     Vimos como quem vinga uma montanha altíssima. No alto, a par de uma perspectiva maior, a vertigem...Ademai, não desafiaria a incredulidade do futuro a narrativa de pormenores em que se amostrassem mulheres precipitando-se nas fogueiras dos próprios lares, abraçadas aos filhos pequeninos?...
     E de que modo comentaríamos (...) o fato singular de não aparecerem mais, desde a manhã de 3, os prisioneiros válidos colhidos na véspera, e entre eles aquele Antônio Beatinho, que se nos entregara, confiante (...)? Caiu o arraial a 5. No dia 6 acabaram de o destruir (...). Antes, no amanhecer daquele dia, comissão adrede escolhida descobrira o cadáver de Antônio Conselheiro. Jazia num dos casebres anexos à latada, e foi encontrado graças à indicação de um prisioneiro. Removida breve camada de terra, apareceu no triste sudário de um lençol imundo, em que mãos piedosa haviam disparzido algumas flores murchas, e repousando sobre uma esteira velha, de tábua, o corpo do "famigerado e bárbaro" agitador. Estava hediondo. Envolto no velho hábito azul de brim americano, mãos cruzadas no peito, rosto tumefacto e esquálido, olhos fundos cheios de terra - mal o reconheceram os que mais de perto o haviam tratado durante a vida.
     Desenterraram-no cuidadosamente. Dádiva preciosa (...) faziam-se mister os máximos resguardos para que se não desarticulasse ou deformasse, redizindo-se a uma massa angulhenta de tecidos decompostos.
     Fotografaram-no depois. E lavrou-se uma ata rigorosa firmando a sua identidade: importava que o país se convencesse bem de que estava afinal extinto aquele terribilíssimo antagonista.
     Restituíram-no à cova. Pensaram, porém, depois, em guardar a sua cabeça tantas vezes maldita - e como fora malbaratar o tempo exumando-o de novo, uma faca jeitosamente brandida, naquela mesma atitude, cortou-lha; e a faca horrenda, empastada de escaras e de sânie, apareceu ainda uma vez (...)...
     Trouxeram depois para o litoral, onde deliravam multidões em festa, aquele crânio. Que a ciência dissesse a última palavra. Ali estavam, no relevo de circunvoluções expressivas, as linhas essenciais do crime e da loucura...

VII
     É que ainda não existe um Maudsley para as loucuras e os crimes das nacionalidades..."

Atividade:

01.O trecho encerra Os Sertões, que retrata a Guerra de Canudos. É a expressão final da nova visão de mundo de Euclides da Cunha. O que mudou no autor com a campanha de Canudos?

02.Os Sertões é um dos grandes marcos do período literário denominado Pré-Modernismo. Que características gerais desse período poderíamos reconhecer no trecho selecionado?

03.O autor narra o destino da cabeça do líder Antonio Conselheiro: enviada para exame para encontrar as causas de sua "loucura". Euclides aponta outra patologia, com ironia. Explique essa afirmação.

                                                                  FIM
     
    

Simbolismo - Lideranças

     Cruz e Sousa e Alphonsus de Guimaraens estiveram à frente do Simbolismo no Brasil

     O Simbolismo, no Brasil, começa oficialmente com a publicação, em 1893, de Missal (prosa) e Braquéis (poesia), de Crua e Sousa. O Poeta Negro (1861-1898), natural de Florianópolis, em Santa Catarina, então ainda chamada Desterro, será o grande nome do movimento simbolista brasileiro, ao lado de Alphonsus de Guimaraens (1870-1921), natural de Ouro Preto, em Minas Gerais.
     Influenciado pelos simbolistas franceses, em especial Charles Baudelaire, Stéphane Mallarmé e Arthur Rimbaud, Cruz e Sousa combinará rigor formal (rimas e métricas muito marcadas) com a procura do inefável, do mistério que não pode ser expresso por palavras, mas apenas sugerido simbolicamente.
     Antífona, texto que abre Broquéis, é uma espécie de síntese das características do movimento. O termo "antífona" significa o verso recitado antes do salmo e aproxima a poesia da religião, da experiência mística. O poeta, visto assim, é o comunicador entre as esferas material e espiritual, capaz de reintegrar os mundos, como antes já havia sido defendido pelo poema Correspondências, do francês Charles Baudelaire.
     Em Cruz e Sousa, é característico o uso de maiúsculas, como em "Amor", "Cor" e "Perfume", expressando assim sua vontade de torná-los absolutos. A adjetivação utilizada pelo poeta catarinense acaba por ter efeito surpreendente: em vez de definir os termos, aprofunda ainda mais sua imprecisão. São "Virgens vaporosas", indefiníveis músicas", "cristais diluídos".
     Há, também, no poema em questão, assim como em toda a obra do autor e na dos artistas franceses que o influenciaram, o uso da sinestesia, a figura de linguagem que entrecruza os sentidos, como no verso "Harmonias da Cor e do Perfume", em que audição, visão e alfato estão em total correspondência e chegam a se confundir.
     De forma coerente, em sua obra, o poeta Cruz e Sousa deu preferência a temas como a morte, a transcendência, a integração e o sagrado, sempre de forma a sugerir os mistérios essenciais da vida.

     Pobre Alphonsus!
     O poeta brasileiro é obcecado pela morte de uma prima por quem era apaixonado

     Nascido em Ouro Preto, Alphonsus Guimaraens (1870-1921) ficou conhecido pela recorrência obsessiva do tema da marte da mulher amada. Tratava-se do falecimento de sua prima Constança, aos 17 anos, por quem o poeta simbolista fora apaixonado. Leia o trecho a seguir:

     A Catedral
     Alphonsus de Guimaraens

Entre brumas, ao longe, surge a aurora.
O hialino orvalho aos poucos se evapora
Agoniza o arrebol.
A catedral ebúrnea do meu sonho
Aparece, na paz do céu risonho,
Toda branca de sol.
E o sino canta em lúgubres responsos:
"Pobre Alphonsus! Pobre Alphonsus!"
O astro glorioso segue a eterna estrada.
Uma áurea seta lhe cintila em cada
Refulgente raio de luz.
A catedral ebúrnea do meu sonho,
Onde os meus olhos tão cansados ponho,
Recebe a bênção de Jesus.
E o sino clama em lúgubres responsos:
"Pobre Alphonsus" Pobre Alphonsus!"

     Antífona
     Cruz e Sousa
     É o marco do Simbolismo brasileiro

Ó formas alvas, brancas, Formas claras
De luares, de neves, de neblinas!...
Ó Formas vagas, fluidas, cristalinas...
Incensos dos turíbulos das aras

Formas do Amor, constelarmente puras,
De Virgens e de Santas vaporosas...
Brilhos errantes, mádidas frescuras
E dolências de lírios e de rosas...

Indefiníveis músicas supremas,
Harmonias da Cor e do Perfume...
Horas do Ocaso, trêmulas, extremas,
Réquiem do Sol que a Dor da Luz resume...

Visões, salmos e cânticos serenos,
Surdinas de órgãos flébeis, soluçantes...
Dormências de volúpicos venenos
Sutis e suaves, mórbidos, radiantes...

Infinitos espíritos dispersos,
Inefáveis, edênicos, aéreos,
Fecundai o Mistério destes versos
Com a chama ideal de todos os mistérios.

Do sonho as mais azuis diafaneidades
Que fuljam, que na Estrofe se levantem
E as emoções, todas as castidades
Da alma do Verso, pelos versos cantem.(...)

Cristais diluídos de clarões alacres,
Desejos, vibrações, ânsias, alentos
Fulvas vitórias, triunfamentos acres,
Os mais estranhos estremecimentos...
Flores negras do tédio e flores vagas
De amores vãos, tantálicos, doentios...
Fundas vermelhidões de velhas chagas
Em sangue, abertas, escorrendo em rios...

Tudo! vivo e nervoso e quente e forte,
Nos turbilhões quiméricos do Sonho,
Passe, cantando, ante o perfil medonho
E o tropel cabalístico da Morte...

Atividade:

01.Morte e _________ são temas presentes tanto na poesia de ____________ quanto na de _________, considerados as duas principais matrizes do ____________ no Brasil, movimento do final do século 19, de inspiração francesa.
As lacunas podem ser preenchidas por:
a) mitologia - Cruz e Sousa - Eduardo Guimaraens - Parnasianismo.
b) melancolia - Alphonsus de Guimaraens - Raimundo Correia - Simbolismo.
c) religiosidade - Cruz e Sousa - Alphonsus de Guimaraens - Simbolismo.
d) amor - Olavo Bilac - Raimundo Correia - Parnasianismo.
e) natureza - Cruz e Sousa - Eduardo Guimaraens - Simbolismo.

02."Ah! plangentes violões dormentes, mornos,
Soluços ao luar, choros ao vento...
Tristes perfis, os mais vagos contornos,
Bocas murmurejantes de lamento. (...)

Quando os sons dos violões vão soluçando,
Quando os sons dos violões nas cordas gemem,
E vão dilacerando e deliciando,
Rasgando as almas que nas sombras tremem.
.........................................................................
Vozes veladas, veludosas vozes,
Volúpias dos violões, vozes veladas,
Vagam nos velhos vórtices velozes
Dos ventos, vivas, vãs, vulcanizadas."

As estrofes acima, claramente representativas do _____________ , não apresentam ______________ .

Assinale a alternativa que completa corretamente as duas lacunas anteriores.
a) Romantismo - sinestesia.
b) Simbolismo - aliterações e assonâncias.
c) Romantismo - musicalidade.
d) Parnasianismo - metáforas e metonímias.
e) Simbolismo - versos brancos e livres.

                                                                FIM